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Política

Sindicato vai entrar com ação contra lei que incorpora 300 servidores do ISE ao quadro efetivo da Polícia Penal do AC

Sindicato vai entrar com ação contra lei que incorpora 300 servidores do ISE ao quadro efetivo da Polícia Penal do AC

PEC que muda a constituição do Acre foi promulgada nesta semana pelos deputados estaduais nessa sexta-feira (24) e causou descontentamento em servidores efetivos da Polícia Penal. Advogada afirma que não há base legal

Polêmica, a Proposta de Emenda a Constituição (PEC) que efetiva e incorpora os agentes provisórios do Instituto Socioeducativo do Acre (ISE) à Polícia Penal, foi promulgada nessa sexta-feira (24), mesmo com a tese já levantada pelo Sindicato que representa os policiais penais e também pelo líder do governo, deputado Pedro Longo, de que a mudança é inconstitucional.

Considerada uma PEC da Assembleia Legislativa do Acre (Aleac), por ter sido assinada por 18 dos 24 parlamentares, a mudança foi aprovada com 14 votos a favor, na última terça-feira (21). Dos 15 deputados presentes, apenas Pedro Longo votou contra.

A advogada Helcíria Albuquerque que conversou com o g1 sobre o caso, reforçou que se trata de medida inconstitucional e que ainda gera insegurança jurídica para o estado, sendo que abre precedentes para que outros provisórios busquem a efetivação aos quadros do estado sem a realização de concurso público.

A PEC alterou os artigos 131 e 134-A da Constituição do Estado. No primeiro artigo foi apenas acrescentado o Instituto Socioeducativo do Acre (ISE) como parte da Segurança Pública do Estado.

A principal mudança ocorre no artigo 134-A, no qual determina que nos quadros da Polícia Penal serão aproveitados os agentes penitenciários socioeducativos e dos cargos públicos equivalentes contratados em caráter temporário.

Veja mudança:

Redação original do art 134- A: “A Polícia Penal é estruturada em carreira, cujo ingresso dar-se-á mediante aprovação em concurso público de provas e títulos.”

Com a nova redação, o texto fica da seguinte forma: “A Polícia Penal é estruturada em carreira, cujo o ingresso dar-se-á mediante aprovação em concurso público de provas e títulos, e por meio de transformação dos atuais agentes penitenciários, socioeducativo e dos cargos públicos equivalentes. Nos quadros da Polícia Penal serão aproveitados os agentes penitenciários socioeducativos e dos cargos públicos equivalentes contratados em caráter temporário com mais de cinco anos de serviço contínuo e ininterrupto, através do benefício da estabilidade que durará até a aposentadoria destes.”

‘Inconstitucional’

Ao g1, o deputado Pedro Longo disse que como se trata de Emenda Constitucional não vai para sanção do governo. A própria Mesa da Aleac é quem promulga e foi o que aconteceu.

“Certamente, depois de publicada o Ministério Público Federal deve propor uma ADIN [Ação Direta de Inconstitucionalidade] para suspender os efeitos”, explicou.

O presidente do Sindicato dos Policiais Penais, Joelison Ramos disse que está em processo de levantamento de informações e que a instituição vai entrar com a ADIN para os efeitos da PEC sejam suspensos.

“A partir da promulgação já está valendo o processo, então estamos juntando toda a documentação, verificando qual o ente competente que irá nos representar [justiça estadual ou federal] nessa ADI e conversando com nossos advogados, e com a própria classe, para ver qual vai ser a maneira mais adequada para levar este processo”, afirmou.

Segundo informou o sindicato, são mais de 300 servidores provisórios que de devem ser incorporados sem a realização de concurso público. O presidente criticou a aprovação da Aleac e afirma que a atitude é “eleitoreira”.

“A gente espera que seja um processo célere e que essa aberração seja corrigida o mais breve possível porque os prejuízos já estão postos. A população, com certeza, não aceita essa atitude eleitoreira tomada pelos nossos parlamentares. Já que é uma casa de leis, deveriam respeitar nosso ordenamento jurídico e a Constituição Federal, mas infelizmente no período eleitoral, estão relativizando tudo”.

‘Questão humanitária’

Um dos deputados que assinou o documento, Roberto Duarte, logo após a aprovação do novo texto, defendeu a mudança.

“Essa PEC é uma questão humanitária. Ela foi apresentada por 18 dos 24 deputados do Acre, não sou o autor dela, é da Assembleia Legislativa do Acre como reconhecimento a alguns trabalhadores que dedicaram suas vidas e hoje correm o risco de serem jogados na rua sem qualquer direito. Temos servidores do ISE que têm 27 anos de serviço prestado ao Estado e tem mais de 54 anos de idade e não tem mais o que fazer da vida”, destacou o deputado.

A efetivação de servidores deve contemplar servidores que têm cinco anos ininterruptos de serviço prestado ao instituto. “A Polícia Penal tem hoje um déficit de, pelo menos, 60% de policiais penais. Temos uma categoria com mais de 1,2 mil policiais penais e se a gente computar aí 60%, são 700 vagas dentro da Polícia Penal do Acre e que o governo tem a obrigação de preencher”, frisou Duarte.

ato pp webPoliciais penais fazem ato contra PEC que propõe efetivação de servidores do ISE com incorporação à categoria no AC — Foto: Arquivo

Entenda porque a PEC é considerada inconstitucional

O g1 conversou com a advogada Helcíria Albuquerque que também é professora de direito Constitucional e Administrativo e doutoranda na área com vasta experiência sobre o assunto.

Ela explicou que a Constituição Federal, como todo ato normativo, acompanha a sociedade. Se muda o modelo de governo e sociedade, é necessário que a constituição acompanhe esse modelo. A CF de 88 veio após uma mudança para o regime democrático, sendo que também veio a administração pública como é no modo atual.

Esse modelo, segundo destacou, é fundamentado nos princípios da administração pública da legalidade, moralidade, impessoalidade, e eficiência.

“O legislador, quando olhou para a administração pública disse: quero uma administração eficiente e para isso, pontuou que escolheria os melhores. Qual o modelo que escolho os melhores? Concurso público.”

“E disse mais: só existe no Brasil, considerado servidor público efetivo se essa origem de entrada se der por meio de concurso público. Só existe este meio do ponto de visa constitucional legal. Então, é preciso que você faça um concurso público para que possa ser chamado, de acordo com a CF de 88, de uma pessoa que é servidor público efetivo”, explicou.

A advogada explicou que, apesar de o constituinte prever outros modelos, como o temporário, provisório, por exemplo, essa contratação só pode ser feita até a realização de um concurso público, ou seja, tem que ter um prazo determinado de início e fim do contrato.

“Até que tenha o concurso, não se pode deixar a administração à mercê, sem ter quadro de pessoal, então, em excepcionalidade de urgência, se pode contratar pessoas para provisoriamente e temporariamente, com data para entrar e data para sair, no serviço público enquanto coloco efetivo lá dentro. Então, não posso pegar pessoas provisórias e transformá-las, a meu bem querer, porque sou legislador infraconstitucional, e dizer: agora, essas pessoas aqui vão se tornar efetivas. Foi feito, mas foi feito de forma dolosa, não tem amparo legal”, destacou.

Helcíria criticou a medida e afirmou que todos estão sujeitos à constituição federal e que a Constituição Estadual, e mesmo a Lei Orgânica dos municípios, não podem contrariá-la.

Insegurança jurídica

A advogada pontuou ainda que o direito não é uma ciência exata e que ele cabe interpretações, porém, alerta que não se pode ignorar o que está definido da CF.

“Ninguém pode fugir do que a Constituição amarra. No artigo 37, onde fala da administração pública, costumo dizer aos meus alunos que ela é como um guarda-chuvas, que abriga toda a legislação infraconstitucional que não for de encontro a ela. Esse é um caso gritante, politiqueiro. Porque a olho nu, não precisa ser advogado para perceber que há um vício constitucional, porque efetivo é só quem é concursado”, pontua.

Ela finaliza dizendo que a PEC abre precedentes para que outras áreas busquem medidas semelhantes.

“Você cria uma insegurança jurídica. Existem carreiras que fazem processo seletivo, que é diferente do concurso público que é mais rígido. E viraria uma balbúrdia se todas as áreas decidem enviar PEC para efetivação de provisórios”, concluiu.

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