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Política

DPU recomenda que prefeito de Rio Branco pare de fazer discurso de ódio sobre musical com Papai Noel gay

Tião Bocalom se manifestou contra a iniciativa que foi aprovada pela FGB no último dia 26. Defensoria deu prazo de 10 dias para prefeito responder se vai ou não acatar recomendação

Após as declarações dadas pelo prefeito de Rio Branco, Tião Bocalom, de que iria barrar a aprovação de um musical com Papai Noel Gay, a Defensoria Pública da União recomendou que o gestor pare de disseminar fake news e discurso de ódio.

No último dia 26, a Fundação de Cultura, Esporte e Lazer Garibaldi Brasil (FGB) aprovou o projeto que propõe uma apresentação musical voltada para o público LGBTQIAP+ durante as festas de Natal em Rio Branco. A aprovação tem gerado polêmica, mas, vale destacar que o musical já ocorre em Rio Branco há pelo menos 12 anos.

Ao g1, a Prefeitura de Rio Branco informou que o prefeito vai acatar qualquer orientação que vier da Justiça, Ministério Público e Defensoria, mas que tem consciência de que não está fazendo nada de errado e que apenas defendeu a cultura, a família e as crianças. Mas, se a DPU orientou, ele vai acatar.

Na recomendação, a DPU destaca que as manifestações públicas feitas por Bocalom alimentam o ódio e a intolerância, ao deturpar a finalidade e o público-alvo do projeto e propagar discurso homofóbico. O órgão deu ainda um prazo de 10 dias para que o gestor responda se vai ou não acatar a recomendação.

No documento, a DPU descreve uma entrevista dada pelo prefeito a um veículo de imprensa em que ele diz que pediu que o projeto não passe a diante e que ele quer que “respeitem a cultura cristã”.

Para a Defensoria, as manifestações do gestor revelam “profunda ignorância” sobre o real conteúdo, objeto e público-alvo do projeto. E que ele “produz e propaga fake news com nítido viés homofóbico, autoritário, excludente e estigmatizante da comunidade LGBTQIA+.”

O órgão cita ainda que o evento já é realizado em Rio Branco, em horário noturno e em espaço direcionado exclusivamente ao público adulto, desde 2009. E que, inclusive, já foi contemplado nos anos de 2013 e de 2019 por meio do Sistema Estadual de Cultura, gerido pela Fundação Cultural Elias Mansur.

Por fim, a DPI destaca que a narrativa do prefeito de Rio Branco de que o evento teria potencial para afetar de forma prejudicial o público infantil é “infundada, descabida e resultado de ignorância”.

Uma cópia da recomendação também foi encaminhada ao Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Acre, ao Ministério Público do Acre e ao Ministério Público Federal no Estado do Acre (MPF-AC) para ciência.

Polêmica

Os debates sobre o projeto se intensificaram mais após entrevistas de Bocalom, afirmando que o projeto não seria aprovado. Por conta disso, o Conselho Estadual de Combate à Discriminação LGBT do Acre divulgou uma nota criticando o posicionamento do gestor.

“De nenhuma maneira, a apresentação incita crianças, jovens, adultos e idosos a estarem se transformando em homossexuais ou buscando atingir esse objetivo”, diz parte do comunicado assinado pelo presidente Germano Marino.

O musical está orçado em R$ 15 mil e, após o resultado final da análise técnica, depende do veto ou aprovação do prefeito de Rio Branco. A reportagem tentou contato com o autor do projeto, mas foi informada que ele não se posicionaria.

A assessoria de comunicação da prefeitura afirmou que o projeto passou na classificação de documentos e agora segue para análise de mérito. São, ao todo, 167 iniciativas que são avaliadas.

Sobre o posicionamento do prefeito, de que o projeto não seria aprovado, a assessoria apenas destacou que os trâmites de julgamento dos méritos estão sendo cumpridos.

Musical

Conforme o conselho, a ideia é que um artista faça a apresentação montado de drag queen vestida de Papai Noel ao som de músicas natalinas e distribuindo insumos de prevenção ao HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis. “Buscando promover uma reflexão coletiva, com foco na preservação de doenças sexualmente transmissíveis, o combate às práticas discriminatórias voltadas a população LGBTQIAP+”.

Na apresentação também haverá arrecadação de alimentos não perecíveis para distribuição de cestas básicas para pessoas carentes. O musical é feito em Rio Branco há 12 anos e já beneficiou 600 famílias com cestas básicas.

“É absurdo o tamanho e a proporção discriminatória que se chegou com isso. E evidente que fique registrado que o projeto não fere em nada a cultura ou concepção de nenhuma crença”, destaca o comunicado do conselho.

No comunicado, ele orienta o autor do projeto a entrar na Justiça contra o prefeito, com apoio do Centro de Atendimento às Vítimas (CAV) do Ministério Público do Acre (MP-AC), por causa das declarações.

“Papai Noel é um advento cultural para todas as pessoas, para todas as famílias, independente de orientação sexual, identidade de gênero, cor, raça, idade, etnia ou religião. Por favor, assessorem melhor o prefeito de Rio Branco para que o mesmo não seja mais um gestor homofóbico”, pontua.

‘É censura’

Outro que se posicionou contra foi o produtor cultural Sérgio de Carvalho. Ele usou também a rede social para dizer que barrar o projeto seria um ato claro de censura.

“Se o prefeito Bocalom interferir na seleção dos projetos da Fundação Garibaldi Brasil e pedir o arquivamento da proposta “Papai Noel Gay”, como se pronunciou, irá ferir o Sistema Municipal de Cultura e passar por cima, de forma arbitrária, inédita e autoritária, do Fórum de Cultura e de todos os participantes que indicaram a Comissão de Avaliação”, pontuou.

Carvalho, que também é ex-presidente da FGB, disse que nunca houve algo semelhante em gestões passadas.

“Será censura! Que nunca aconteceu em toda a história da FGB. Cabe unicamente à Comissão de Avaliação, indicada pelo Movimento Cultural, a seleção dos projetos por seu mérito técnico e qualidade artística. A ninguém mais.Esta interferência abre precedentes terríveis, ameaçando futuramente qualquer projeto com temas LGBTQIA+, de Cultura afro-brasileira ou indígena, frente ao fundamentalismo religioso que assombra os poderes. É inaceitável um projeto ser desclassificado desta forma. Um desrespeito à toda comunidade artística. É autoritarismo puro”, reclamou.

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