Denúncia foi divulgada pelo MP-AC nesta quarta-feira (16). De acordo com o órgão, a denúncia contra os dois motoristas é pelo homicídio, racha e pelo menos mais dois crimes acessórios
O Ministério Público do Acre (MP-AC) ofereceu denúncia à Justiça contra Ícaro José da Silva Pinto e Alan Araújo de Lima suspeitos de fazer racha que resultou na morte de Jonhliane Paiva de Souza, de 30 anos, no dia 6 de agosto, na Avenida Antônio da Rocha Viana, em Rio Branco.
A denúncia contra os dois motoristas é pelo homicídio, racha e pelo menos mais dois crimes acessórios, de acordo com o promotor que acompanha o caso, Efrain Mendoza. O dois seguem presos, o Ícaro Pinto no Batalhão de Operações Especiais (Bope) e o Alan Lima no Francisco D’Oliveira Conde.
“Tanto o homicídio e o racha foram denunciados e outros crimes acessórios, tais como fuga do local do fato, omissão de socorro, previsto no CTB [Código de Trânsito Brasileiro]”, complementa o promotor.
Mendoza disse que, com base no inquérito e os laudos periciais, o racha foi uma das principais condutas apontadas ao final das investigações da polícia.
“Racha é uma das principais condutas verificadas pela perícia técnica, onde é medida a velocidade em trechos da [via] Antônio da Rocha Viana e mostra que os dois veículos estavam numa verdadeira disputa. É importante salientar que o racha não precisa de um acordo por escrito, algo registrado em cartório. Basta uma concordância tácita para que ocorra uma disputa automobilística”, disse o promotor.
O G1 entrou em contato com o advogado Sanderson Moura, que faz a defesa de Ícaro, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem. Mas, ele tinha afirmado na última semana que preferia não comentar o caso publicamente e que se restringe a defesa nos autos.
O advogado de Alan Lima, Romano Gouveia, sustenta que Lima não participou de racha e afirmou que vai fazer defesa preliminar e sustentar a defesa dele, além de tentar impugnar a prisão preventiva dele no julgamento do mérito do habeas corpus, que deve ser julgado nesta quinta-feira (17).
“Por mais que o promotor tenha fé pública, a palavra dele, por si só não é absoluta e isso ainda vai ser julgado. Nós vamos fazer defesa preliminar dele, vamos sustentar o habeas corpus amanhã [quinta, 17] dele e impugnar a prisão. Acreditamos cada dia mais que o Alan é inocente. As provas estão aparecendo, a perícia mostra que não há pega, o sigilo telefônico dele foi quebrado e não se encontrou nada. Não adianta querer atrelar ele”, disse.
Indiciados
Os dois condutores já tinham sido indiciados pela Polícia Civil, que concluiu as investigações no dia 11 de setembro. Segundo a perícia, Pinto que conduzia a BMW que matou a vítima, estava a uma velocidade estimada de de 151 km/h. O motorista do outro carro, Alan Araújo de Lima, estava a 86 KM/h. Os dois foram indiciados por homicídio qualificado.
O delegado Alex Danny, que comandou as investigações, disse que, além do homicídio qualificado, eles também foram indiciados pelo crime de racha. A velocidade em que o carro de Ícaro atingiu era três vezes maior que a permitida na Avenida Antônio da Rocha Viana, que é de 50 km/h.
“No inquérito específico, Alan e Ícaro foram indiciados pelos crimes de racha, que tem previsão no Código de Trânsito Brasileiro [CTB], homicídio qualificado por circunstância de que não deu à vítima a possibilidade de esboçar a mínima reação de defesa”, explicou o delegado.
O delegado acrescentou que neste inquérito principal, tanto a namorada de Ícaro, Hatsue Said Tanaka, quanto Eduardo Andrade, que estava no carro com Alan, serviram como testemunhas do caso e não foram indiciados.
Além dos crimes principais que foram investigados ao longo do inquérito policial, Danny disse que foram identificados outros crimes considerados secundários e que devem ser investigados de forma paralela, como o crime de causar aglomeração de pessoas dando o risco à saúde pública.
Morte de Jonhliane
Johnliane foi atingida quando ia ao trabalho pela BMW em alta velocidade, que era pilotada por Ícaro. Ícaro e Alan faziam um racha, segundo a polícia, no momento em que a mulher foi atingida.
Alan foi preso preventivamente no dia 14 de agosto, na casa de um irmão. Já Ícaro foi preso no dia 15, no posto da Tucandeira, divisa do Acre com o estado de Rondônia. Ele voltava de Fortaleza, para onde tinha ido após sofrer ameaças, segundo a defesa dele.
O pedido do habeas corpus de Ícaro Pinto foi negado no dia 10 de setembro por unanimidade pela Câmara Criminal em Rio Branco.
Perícia
Com a conclusão do inquérito, a perícia apontou que a velocidade de impacto da BMW era de 151 km/h na hora do acidente. A motocicleta conduzida por Johnliane estava em 46km/h e o carro de Alan a 87 km/h.
“No local da ocorrência, conseguimos materializar a velocidade por no mínimo dois metros. Então, o método que a gente utilizou pelos danos, mais a frenagem, mais as sulcagens, tudo isso já conhecido por tabelas internacionalmente, fizemos o cálculo de toda a deformação do veículo, medições devidas de todo veículo e a gente consegue chegar nesse cálculo preciso, que é essa velocidade mínima que nós calculamos de cada veículo”, explicou o perito João Thiago.
O perito Diego Timóteo, que fez as análises no carro conduzido por Alan, confirmou que a peça, alvo de buscas da Polícia Civil na última semana, tinha sido retirada e que ela é responsável por turbinar o motor do veículo.
“A perícia constatou que esse elemento foi suprimido antes de ser conduzido para a nossa seção de identificação veicular. Ele pode gerar um ganho de eficiência, mas, para que ele gere potência, são necessários outros elementos e outros exames para categorizar isso”, pontuou.
Festa
As investigações apontam que os envolvidos no acidente participavam de uma festa. Quando conversou com o G1, a estudante de administração Hatsue, namorada de Ícaro, afirmou que o casal participava de uma festa, onde consumiu bebida alcoólica, e discutia antes de o carro atingir Johnliane. O motivo da discussão, segundo ela, foi uma crise de ciúmes porque um amigo a abraçou. Ela negou conhecer o motorista do outro carro, Alan, e rechaçou a disputa de racha.
Hatsue afirmou que o namorado não sabia no que tinha batido e decidiu seguir dirigindo.
“No momento em que aconteceu a tragédia, foi tudo muito rápido. A primeira reação do Ícaro foi continuar dirigindo. A gente não sabia direito o que tinha acontecido. Quando ele parou o carro, saímos, olhei, e percebi o que tinha acontecido, ficamos muito sem reação”, relembrou.
Menos de 10 minutos após a batida, Ícaro e a namorada foram flagrados por uma câmera de segurança caminhando de mãos dadas. O carro foi abandonado algumas ruas após o acidente. Segundo Hatsue, o momento mostrado pelo vídeo é a hora em que ela tentava acalmar o namorado.
O casal foi resgatado por Diego Hosken, de 32 anos, investigado pela polícia por dar fuga para o motorista. Hosken foi preso dirigindo embriagado e por tentar atropelar policiais militares durante a abordagem. Ele foi liberado após pagar fiança.
Racha
O principal motivo para o atropelamento e morte de Jonhliane teria sido um racha feito entre Ícaro e Alan. Segundo as investigações, Alan estava na mesma festa que o amigo e os dois disputavam um racha antes da BMW de Ícaro bater na motocicleta de Jonhliane.
O MPAC, por meio da 6ª Promotoria de Justiça Criminal, com atribuições perante a 2ª Vara do Tribunal do Júri de Rio Branco, destacou, na época do acidente, que a investigação constatou que os acusados estavam disputando racha e fugiram do local do crime sem prestar socorro à vítima.
“Se não fosse ele [Alan], teria havido racha? Obviamente que não. Se ele deixasse a Ícaro seguir sua vida, possivelmente Johnliane ainda estaria viva. Então o racha ocorreu por conta dessa competição e mesmo que ele não tivesse participado do racha e tivesse mantido uma velocidade ordeira, quem hoje estaria respondendo seria apenas o primeiro denunciado, que é o Ícaro”, sustentou o promotor ao oferecer a denúncia.
Um vídeo de câmeras de segurança mostra os dois carros em alta velocidade na Avenida Antônio da Rocha Viana.