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Maju Coutinho: “Nunca me senti tão essencial como jornalista quanto agora”

MARIA JÚLIA COUTINHO, a Maju, é dura na queda. Para o bem (e para o mal também), essa paulistana, “cria da Zona Leste”, se tornou uma das jornalistas mais conhecidas do país. Isso se traduz em números: só no Instagram, ela acumula 1,3 milhão de seguidores. Coloque o nome dela no Google: mais de 700 mil resultados estão relacionados a ela. Qualquer coisa que Maju faz vira notícia. Quando foi vítima de racismo, o Brasil inteiro se uniu na campanha #SomosTodosMaju. Ao assumir a apresentação do Jornal Hoje, em setembro de 2019, fofocas sobre seu desempenho inundaram sites de celebridades. Com poucos meses como âncora, foi pega por uma pandemia, que derivou numa das maiores crises sanitárias, políticas e econômicas do país, cabendo a Maju encontrar o tom adequado para anunciar acontecimentos dramáticos como o pedido de demissão do ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, ou a morte do adolescente João Pedro durante uma ação policial no Rio de Janeiro.

Nada disso a tirou do prumo. Ou quase nada. “Fiquei baqueada com as mortes de Moraes Moreira e Aldir Blanc. Depois que terminei as edições do jornal sobre eles, no caminho de casa, chorei”, revela. “Não foi dos momentos mais graves, mas é como se fosse um reflexo de todos os outros. Não tinha a ver só com Moraes ou Aldir, mas com um conjunto de coisas. [A morte de] João Pedro também mexeu muito comigo”, diz. “Mas nunca me senti tão essencial e tão necessária como jornalista quanto agora.” Passar por tantos altos e baixos não é para qualquer uma – e não se trata aqui de encaixá-la no estereótipo racista de “mulher negra forte”. Anos de análise ajudaram Maju a atravessar crises e cravar os dois pés no chão em momentos de superexposição. “Me recolho, invisto na terapia e pratico meditação, que me colocam no eixo. Também tenho suporte da minha família”, diz ela. “Sou jornalista, não celebridade. Estou neste posto hoje mas, amanhã, posso não estar. Por isso mantenho a discrição: pouco interessam detalhes do meu casamento, onde janto ou passo férias. Não posto nada sobre isso. Mesmo assim, a TV cria imaginários que fazem as pessoas idealizarem um glamour que não existe.”

Contra o racismo, Maju se protege com uma profunda consciência de sua negritude, graças ao fato de seus pais terem sido ligados ao movimento negro nos anos 1970. “Em seguida ao episódio racista que vivi quando estava no Jornal Nacional, o [William] Bonner e a Renata [Vasconcellos] aderiram àquela campanha #SomosTodos Maju. Lembro que eu disse a eles: ‘Agradeço o que vocês estão fazendo por mim, mas sou uma mulher negra. Desde criança, tenho consciência da minha negritude, porque passei por outras situações como essa. Não considero normal, mas estou blindada’”, conta. “Essa é a minha realidade: quanto mais escuro o tom da pele, mais você é animalizado. Claro que ficam marcas das agressões que sofri mas, naquele momento, enfrentei. O que me comoveu mesmo foi a quantidade de pessoas me apoiando. Foi muito impactante.”

Filha de professores, Maju descobriu a vocação para o jornalismo no ensino médio, após um teste vocacional. Até então, pensava seguir a carreira dos pais. Chegou a iniciar a faculdade de pedagogia, na USP, e dava aulas já como concursada em uma escola no ABC, na Grande São Paulo, ao mesmo tempo em que estudava jornalismo na faculdade Cásper Líbero. Nas idas e vindas entre os três compromissos, sofreu um acidente de carro e concluiu que era hora de optar. Escolheu o jornalismo. Durante a universidade, foi estagiária da TV Cultura. “A primeira pessoa que colocou minha mãozinha para aparecer na tela foi uma mulher”, lembra ela, cuja ascensão foi marcada pela parceria com outras mulheres: a que recebeu seu e-mail pedindo uma oportunidade na TV Globo; a que decidiu que ela deveria deixar a reportagem e assumir a previsão do tempo no JN. “Tenho muitas parceiras, como Flavinha [Oliveira], [Andréia] Sadi, Renata Vasconcellos, além de referências como Glória Maria, Dulcineia Moraes, Zileide Silva”, diz. Agora, com a responsabilidade de ser ela própria uma inspiração, preocupa-se em não transformar sua trajetória em “deslumbramento”, nem em ser usada para reforçar o discurso meritocrático. “Estou por mérito onde estou, mas é injusto eu pregar esse discurso sabendo que muitas meninas não têm o mínimo de base para começar de onde eu comecei – que já foi atrás de muitas das minhas colegas.”

maju webMaria Júla Coutinho, a Maju: à frente do "Jornal Hoje", ela anunciou acontecimentos dramáticos como a primeira morte provocada pela Covid-19 no país (Foto: Fabio Rocha)