Levantamento do GLOBO com 21 instituições financeiras aponta para aumento de 0,75 ponto percentual. Preocupação com a inflação de 2022 já está no radar
O Banco Central (BC) deve elevar, novamente, a taxa de juros em 0,75 ponto percentual na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que termina nesta quarta-feira (5). Pelo menos, essa é a aposta dos agentes de mercado , segundo levantamento realizado pelo GLOBO com 21 instituições financeiras e corretoras.
Com isso, a Selic deve passar dos atuais 2,75% para o patamar de 3,50%. Para o fim do ano, a maioria das casas aposta em uma taxa de 5% .
No último boletim Focus, relatório semanal divulgado pelo BC com as projeções do mercado, as expectativas para a Selic estavam em 5,5% para o término deste ano e 6,25% para o fim de 2022.
A decisão do Comitê já vem sendo adiantada pelo presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, que em aparições públicas ressaltou que um novo aumento em 0,75 iria ocorrer, seguindo a comunicação divulgada em março.
Ele demonstrou preocupação com uma inflação persistente, ainda que temporária, e com o risco fiscal. E tem motivos para isso.
O IPCA-15, prévia da inflação oficial do país, ficou em 0,6% em abril. No acumulado dos últimos 12 meses, o índice acumula alta de 6,17%. O resultado ultrapassa o teto da meta estabelecida pelo BC para 2021, que é de 5,25%.
O foco, portanto, deve se dar mais em qual será a sinalização da autoridade monetária no comunicado que acompanha a taxa. Especialmente sobre a indicação ou não de uma normalização parcial da Selic.
Segundo analistas ouvidos pelo GLOBO, a preocupação com o real desvalorizado frente ao dólar e o efeito que isso causa para o aumento dos preços estão no radar do Banco Central.
Além disso, segundo eles, já há a preocupação de que a elevação da inflação deste ano começasse a afetar as expectativas para 2022.
Efeito no dólar
Desde a última reunião, o dólar apresenta oscilação. A divisa americana chegou a superar a casa dos R$5,80 em alguns pregões, mas deu sinais de desvalorização nas últimas semanas, fechando pela primeira vez com uma queda mensal no ano, em abril.
Para o superintendente executivo de Macroeconomia do Santander, Maurício Oreng, a decisão do Copom de elevar a taxa em março teve efeitos na queda do dólar, mas fatores internacionais influenciaram mais na valorização do real.
“Tem um movimento internacional, com as expectativas de retomada da economia e política monetária expansionista, que deve continuar por mais tempo. A resolução da questão do Orçamento também evitou uma deterioração em curto prazo”, disse Oreng, destacando que a questão fiscal ainda preocupante do país limita o otimismo em relação aos ativos brasileiros.
Já para o economista-chefe da Novus Capital, Tomás Goulart, o impasse em relação à aprovação do Orçamento contaminou o noticiário econômico durante todo o mês de abril, impedindo que a alta de juros tivesse um efeito mais rápido sobre o dólar.
“Quando a questão do Orçamento foi solucionada, isso permitiu que o efeito da subida dos juros, além do esperado, começasse a prevalecer.”
Segundo Goulart, um dos principais responsáveis pelo desempenho ruim do real frente ao dólar é justamente a baixa taxa de juros. Isso porque ela diminui a rentabilidade que investidores estrangeiros teriam ao alocar seus recursos no Brasil.
Os analistas ainda destacam que a inflação no país sofre de um efeito externo, pois com o dólar elevado somado à alta das commodities, os preços das matérias-primas ficam mais caros.
Isso explica por que o índice vem aumentando, mesmo com o consumo das famílias estando em patamar baixo.
“À medida em que o real vai se apreciando, podemos ter uma mudança dessa dinâmica. A primeira variável a se observar então é o câmbio”, disse Goulart.
Retração da demanda
Por outro lado, uma alta da Selic pode ter efeitos que irão reprimir a atividade econômica, como o encarecimento para obter financiamento.
Para Oreng, no entanto, a elevação é necessária para evitar que as expectativas de inflação para 2022 não se deteriorem ainda mais.
“Esse aperto monetário, aos poucos, vai conter o crescimento da demanda. Estamos vivendo um choque forte nos preços das matérias-primas e o BC não pode mais acomodar. Mas o pior cenário seria o BC não subir juros e a inflação sair do controle, prejudicando ainda mais o crescimento no longo prazo.”
Goulart pondera que a atração de mais capital estrangeiro para o país pode suprimir os efeitos restritivos que mais juros na economia representam.
“Atrair capital estrangeiro que não estava vindo para cá pode limitar o efeito negativos que mais juros podem ter para a atividade econômica.”
Ritmo da alta
Se o percentual do aumento é quase consensual, há diferenças em relação ao tom que será utilizado. Para o economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez, o Comitê deve ser menos taxativo.
“Avaliamos que o BC não vai ser tão taxativo quanto foi na última reunião. Mas, ao mesmo tempo, vai se demonstrar bastante austero contra as expectativas de inflação e vai manter o aspecto parcial de redução do estímulo monetário.”
Para Oreng, haverá a preocupação de deixar claro que a meta de inflação para o ano que vem será perseguida, o que pode ser feito sem o caráter parcial da normalização, expresso na última comunicação.
“Ele vai enfatizar que o processo de ajuste vai depender da evolução do cenário. Acredito que eles vão reforçar essa dependência dos dados para embasar a atuação. Eles podem fazer isso mantendo a normalização parcial ou não.”
Goulart segue na mesma linha:
“O BC vai falar que normalização ainda segue parcial, mas deixando claro que é algo com menor importância. Eles já devem sinalizar que na reunião seguinte, em junho, vai ocorrer uma nova alta de 0,75 ponto percentual.”
Volta para a renda fixa?
A perspectiva para um ciclo de altas na Selic melhora a perspectiva dos rendimentos em renda fixa. Mas os analistas ainda alertam que há riscos, sendo a diversificação da carteira, a melhor opção.
“Tudo vai depender de qual vai ser o ponto final da Selic. Os ativos de renda fixa vão se beneficiar mais quando tivermos o fim do ciclo de altas.”
Sanchez complementa:
“Pode haver uma maior valorização no curto prazo. Mas nada que seja muito substantivo. O ideal é optar pela diversificação.”