Governos locais poderão conceder descontos. Para o consumidor, não há ganho
Diante do risco de perda de arrecadação de 25% a 30% caso não fechassem um acordo em torno de uma alíquota fixa de ICMS, os estados decidiram propor um valor de R$ 0,999 por litro de diesel. A nova lei, em vigor desde 11 de março, exigia a formação de um consenso para evitar a adoção de um critério mais desvantajoso aos governos locais.
Até a noite de terça-feira, técnicos ainda finalizavam a nota que embasa a mudança. A expectativa é que o Comsefaz, que reúne os secretários de Fazenda, vote a mudança na quinta-feira.
A fórmula encontrada pelos estados, porém, foi considerada uma saída política, que protege o caixa dos governos locais, mas que não resultará em benefício significativo ao consumidor que vai encher o tanque. Até agora, cada estado tinha uma alíquota própria de ICMS.
A lei em vigor prevê a adoção de uma alíquota única. Caso a saída tivesse sido adotar um valor médio, nove estados e o DF teriam aumento da arrecadação, o que vai na contramão da intenção do governo federal, que propôs a mudança de olho em uma redução no preço na bomba.
O valor de R$ 0,999 é, na prática, maior do que o aplicado hoje pela maioria dos estados, mas os governos poderão dar “descontos” nessa alíquota. Ou seja, há uma espécie de teto geral, mas cada um pode manter o valor que pratica atualmente. Trata-se de uma mudança que, na prática, permite que a arrecadação permaneça como está, sem ganho ou perda.
Gasolina: ICMS congelado
Antes da nova lei, os estados definiam um percentual que incidia sobre o preço, não um valor fixo. No caso do Rio, o percentual era de 12%, o que resultava em um valor de R$ 0,60 por litro (já que o ICMS está congelado pelos governadores desde novembro, como parte do esforço para conter a alta dos combustíveis).
Em vez de cobrar R$ 0,999, o estado pode adotar o valor como referência e conceder um desconto, mantendo o R$ 0,60 atual.
Só foi possível articular esse modelo “tudo muda para continuar exatamente igual” do ponto de vista da arrecadação porque a lei complementar 192 é considerada de caráter generalista. Ela foi aprovada no Congresso em um cenário de escalada do preço do petróleo e sancionada em menos de 24 horas pelo presidente Jair Bolsonaro.
O desconto proposto pelos governos locais, por exemplo, é considerado compatível, pois a lei prevê mecanismos de compensação entre os entes. A lei não obriga o estado a mudar seu regime de tributação, mas dá como alternativa uma opção bem menos vantajosa: adotar a média de preços dos últimos cinco anos, o que resultaria em perda de 25% a 30% na arrecadação.
A nova alíquota fixa, que ainda depende de votação, deve vigorar a partir de 1º de abril.
Para o consumidor, não há ganho imediato com o novo modelo, já que o efeito no valor na bomba é neutro. O único benefício é a menor volatilidade. Até então, o modelo de cobrança do ICMS fazia com que o valor pago em imposto acompanhasse o aumento de preços. Quando o combustível subia, a arrecadação com o imposto estadual aumentava.
Do ponto de vista regulatório, a cobrança do ICMS passa a ser monofásica, concentrada em uma única etapa da cadeia de comercialização, uma exigência da lei. Isso não reduz o preço ao consumidor, mas facilita a fiscalização.
Em ano eleitoral, Bolsonaro tem atribuído aos governadores a responsabilidade pela alta do combustível nos postos. A União já zerou tributos federais sobre o diesel, com a expectativa de reduzir o preço em R$ 0,33 por litro.
O tributarista Giuseppe Melloti, sócio do escritório Bichara Advogados, vê problemas no novo modelo. Se houver queda de preço, pondera, o combustível pode ganhar peso no montante pago pelo consumidor. Por exemplo: se o diesel custa hipoteticamente R$ 7, com o ICMS fixo em R$ 0,999, o valor na bomba iria a R$ 8 (sem considerar os demais impostos).
Neste exemplo, o ICMS equivale a 15% do total pago. Se o preço na refinaria cair a R$ 5, mas o valor do imposto for mantido, ele representará 20% do total pago pelo consumidor.
TSE rejeita consulta
Enquanto não votam na quinta-feira a saída para proteger o caixa com a nova lei para o diesel, os governadores decidiram prorrogar por 90 dias a fórmula de cálculo do ICMS para a gasolina. O montante está congelado desde novembro e seguirá vigente até junho.
Em outra frente, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu não analisar uma consulta feita pelo governo, que questionava se era possível reduzir alíquota de impostos e contribuições sobre produtos e insumos por lei aprovada no Congresso em ano eleitoral. Os ministros avaliaram que os questionamentos eram muito genéricos.