Estudo revela que, em áreas privadas, destruição chegou a 20,6% no mesmo período
Levantamento do projeto MapBiomas mostra a extensão da proteção da natureza proporcionada pelos indígenas brasileiros. Nas últimas três décadas, enquanto a perda de vegetação nativa em áreas privadas foi de 20,6%, nas terras indígenas (TIs) esse número foi de apenas 1%. A pressão sobre essas áreas, porém, está crescendo.
O relatório preparado para ser divulgado hoje, Dia do Índio, mostra que o desmate nesse período foi de 69 milhões de hectares, sendo que somente 1,1 milhão ocorreu nas terras indígenas (TIs). Outros 47,2 milhões de hectares foram desmatados em áreas privadas, e o restante da supressão vegetal ocorreu em outros tipos de terras, como florestas públicas ou unidades de conservação.
“As TIs estão sendo barreiras e escudos contra o desmatamento na Amazônia. São esses territórios que estão mantendo e protegendo a floresta no contexto atual de falta de fiscalização e investimentos em políticas publicas para combater e prevenir o desmate ilegal”, diz Julia Shimbo, Coordenadora Científica do MapBiomas e pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), que coordenou o projeto.
“O contexto atual tem favorecido atividades ilegais como grilagem de terra, garimpo, exploração madeireira e desmate por agentes externos dentro dos territórios indígenas”, diz. “Os povos indígenas dependem dos recursos da floresta e os utilizam, por isso têm interesse em manter floresta em pé”.
O novo levantamento do MapBiomas, projeto que mapeia a ocupação fundiária no Brasil, mostra que as terras indígenas ocupam 13,9% do território nacional e possuem 109,7 milhões de hectares de vegetação nativa, o que corresponde a 19,5% da vegetação nativa do país.
Apesar de mostrar a importância das TIs na conservação de florestas, os cientistas do projeto apontam uma mudança de tendência apontada pelo projeto Deter, do Inpe, que monitora o desmate em tempo real.
“Nos últimos anos, o desmatamento detectado pelo Deter na Amazônia se acelerou em TIs, tendo se multiplicado por 1,7 na média dos três últimos anos quando comparado com a média de 2016 a 2018”, aponta o MapBiomas, destacando que essa mudança ocorreu no governo Bolsonaro.
Garimpo ilegal
Uma preocupação especial nas terras indígenas é o garimpo. Apesar de a área ocupada ainda ser relativamente pequena, cresceu cinco vezes de 2010 a 2020.
“As maiores áreas de garimpo em terras indígenas estão em território Kayapó (7602 hecares) e Munduruku (1592 ha), no Pará, e Ianomâmi (414 ha), no Amazonas e Roraima”, relatam os pesquisadores.
Não é uma coincidência que muitas áreas cobiçadas para mineração estejam em terras indígenas. Como historicamente o processo de colonização expulsou essa população de planícies cultiváveis para áreas de relevo mais irregular, foi natural que muitos povos acabassem encontrando refúgio ao longo dos últimos cinco séculos em áreas mais montanhosas, onde se concentram os minérios.
O garimpo em terra indígena é hoje ilegal, mas pode ser liberado no caso de aprovação do projeto de lei 191/2020, que tramita no Congresso com apoio do Planalto.
Demarcação
Um posicionamento do governo Bolsonaro que pode comprometer a capacidade de proteção florestal é a promessa de não demarcar mais terras indígenas.
Segundo Shimbo, os números mais recentes indicam a importância de se avançar na demarcação e homologação de terras indígenas como forma de frear a atividade especulativa que alimenta a ilegalidade.
“Vários estudos do Ipam mostram a importância e a necessidade de avançar no processo de homologação porque essa indefinição favorece a grilagem de terras e atividades ilegais, em razão da insegurança jurídica que gera”, diz a pesquisadora.
A coincidência entre proteção de vegetação nativa e sua localização em terras indígenas não é restrita à Amazônia. Essa correlação foi vista também em outros biomas, como o Cerrado e a Mata Atlântica.
Como a maior parte da das grandes TIs está na Amazônia, porém, em termos de área e de biomassa o efeito da proteção nessa região é mais relevante. É na Amazônia que está a maior parte do carbono estocado em árvores, que se for emitido resulta em gases do efeito estufa.