O Senador Márcio Bittar (MDB) está prestes a entrar para o olho do furacão por sua condição de relator do Orçamento Geral da União. É que o senador Renan Calheiros (MDB) revelou a amigos que o deputado Arthur Lira (PP), presidente da Câmara Federal (PP) e expoente maior do Centrão, grupo político que dá sustentação ao governo federal, está deveras preocupado “com o que pode vir de investigação” sobre um certo tipo de emenda parlamentar, as ditas “emendas de relator”.
Forçando a barra
No dizer do senador alagoano, a fim de garantir dinheiro também para essas emendas, Jair Bolsonaro, Lira e o centrão querem aumentar o gasto federal em 2022 e decretar moratória de parte dos precatórios. “Isso [emendas de relator] vai causar talvez o maior escândalo do Brasil de todos os tempos”, disse Calheiros na semana passada.
Enigma
Calheiros estava falando do quê? Foi apenas canelada ou conhecimento de causa? Essas emendas também são investigadas pelo Tribunal de Contas da União e serão examinadas pelo Supremo. São rolos dentro de rolos.
Endereço
Apesar de as emendas serem, claro, aprovadas na lei do Orçamento, a liberação do dinheiro para cidades ou outros “entes” não é obrigatória. Em 2021, Lira e Ciro Nogueira (PP-PI), senador ora ministro da Casa Civil, chancelam a distribuição dos recursos, nem sempre em acordo com o resto do governo, dirigindo o trânsito específico do dinheiro (as emendas podem não descer a detalhes). É assim que Bolsonaro paga a conta de não ser emparedado pelo Congresso, ou mesmo impichado.
Finalidade e consequências
Fato é que o dinheiro das emendas facilita a reeleição da “diretoria” do centrão. Sim, “diretoria”, pois o baixíssimo clero se queixa de que recebe pouco, o que tem contribuído para derrotas de Lira na Câmara; há queixa similar no Senado, onde Lira e Bolsonaro tomam muitas tundas.
Engrenagem
Emenda é uma modificação do projeto de lei do Orçamento que o governo envia ao Congresso. “De relator” quer dizer que o relator (o parlamentar que dá forma final a um projeto de lei) do Orçamento propõe tais modificações, a serem votadas por deputados e senadores. Mais de metade do valor das emendas parlamentares de 2021 é de relator (existem as individuais e outras, merrecas). Equivalem a cerca de 2% da despesa federal.
Anonimato
Tais emendas são distribuídas sem critério de política pública, quase de costume. É difícil saber quem são seus padrinhos, muita vez o dinheiro é transferido sem contrato ou projeto de uso e não se sabe da eficiência ou justiça da despesa.
Stop
Por esse motivo, Cidadania, PSB e PSOL foram ao Supremo pedir a suspensão dessas emendas. Desde junho, a ação tarda na mesa de Rosa Weber. Caso a ministra suspenda o negócio, criará um salseiro na “base” do governo. Mas nada diria, nem pode, sobre malversações do dinheiro.
O ovo da serpente
Em geral, emendas picotam parte do que sobra do Orçamento (parte do 5% que não é gasto obrigatório) em pequenas obras (posto de saúde, asfalto, centro esportivo, escola, estrada, ponte, trator, poucas em obras maiores). Não é dinheiro “roubado” pelo parlamentar. Como mais e mais emendas têm sido liberadas sem qualquer controle técnico prévio, teme-se rolo criminal.
Compasso
Apesar de boatos de rolo maior, ainda não há “fato determinado” para, por exemplo, se criar uma CPI. Pelo que se sabe até agora, o “Bolsolão” é apenas uma mutreta política com fumaças de inconstitucionalidade.
Dúvida
Mas parlamentares criariam uma CPI para investigar dinheiros do interesse da maioria de seus pares? Criariam problemas com eventuais aliados na eleição de 2022? Só por milagre; talvez com a revelação de um escândalo daqueles, nos jornais. Escândalo daqueles que, hoje em dia, quase ninguém está disposto a fazer. O país e suas elites se acomodaram em um acordão, se cansaram, também se locupletam ou desistiram: o país como que apagou. Se esse rolo estourar, seria uma estaca a passar perto do coração de Bolsonaro e aliados.
Decifra-me
Conforme avança, sob duras penas, o mandato de Jair Bolsonaro, ele vai deixando aliados e ex-aliados abandonados à beira da estrada. De Santos Cruz a Zé Trovão, por causa de desavenças, de supostas necessidades políticas ou por mera conveniência, o presidente parece cultivar o hábito de virar as costas aos correligionários e seguir em frente.
Capital
Assim, Bolsonaro fortalece a fama de ser “pouco confiável”. Porém, ainda dispõe de crédito com seus liderados. Amigo e colega de ofício do caminhoneiro Zé Trovão, Marinaldo Machado afirma que “o presidente poderia, sim, tentar fazer algo” em favor do líder preso. “Mas qualquer coisa que ele faça será vista como arbitrariedade”, ele afirma.
Via…
Apesar de a maioria dos “abandonados” manter apoio ao governo, a suposta falta de ação de Bolsonaro alimenta teorias de que o grupo do presidente estaria disposto a diminuir a concorrência eleitoral.
Limpa
O que mais incomoda os aliados é ver o sempre eloquente Bolsonaro calado sobre as prisões decretadas pelo STF. “Zé Trovão se tornou uma figura política e pode até concorrer em 2022. O que pensamos é que quem já está lá enxerga ela como um possível concorrente. Só isso explica o silêncio”, afirma Machado.
Persistência
“O silêncio é assustador”, disse Graciela Nienov, que assumiu o PTB no lugar de Roberto Jefferson, também preso. “Mesmo que Bolsonaro não recolha seus feridos, continuaremos no apoio ao presidente porque ele representa nossas crenças”, afirma ela.
Fica…
Circula nos grupos das prévias do PSDB um vídeo protagonizado por Tasso Jereissati (CE) que, segundo tucanos, pode ser capaz de mexer com o coração de Geraldo Alckmin, hoje disposto a deixar o partido que ajudou a fundar em 1988, para ser novamente candidato ao governo de São Paulo.
…vai
Durante discurso recente a filiados do partido, ao lado do governador Eduardo Leite (RS), o senador diz que Alckmin está “praticamente sendo expulso do PSDB de São Paulo”. Depois, Tasso fala em resgatar a “lealdade” no partido.
2022
A defesa de Tasso pode até não ser suficiente para manter Alckmin no PSDB, mas, segundo quem entende, sinaliza longe: se Leite vencer as prévias e atrair o apoio do União Brasil, o ex-governador poderia migrar para o novo partido, numa aliança eleitoral.
Guerra
Rodrigo Garcia (PSDB), vice governador de São Paulo e candidato ao cargo de governador no próximo ano, tem contado uma historinha quando questionado sobre as incertezas na terceira via: “Os soldados todos os dias queriam saber do motorista do general se ele tinha ouvido algo sobre quando seria o fim da guerra”.
Guerra 2
As respostas do motorista eram sempre negativas. Até que, finalmente, ele disse que o oficial havia lhe dirigido a palavra sobre o tema: “O general falou ‘você que conhece os soldados, tem ouvido algo sobre o fim da guerra?”. Tá nesse preço, um lado querendo saber o que o outro pensa.