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Mulheres trans denunciam preconceito ao terem entrada negada em casa noturna no AC: ‘Constrangidas’

Gilvana e Jo foram informadas pelo dono da boate que teriam que pagar porque ‘não eram mulheres’, na noite do ocorrido a entrada na boate era livre para mulheres. Elas também denunciam policiais militares que atenderam ocorrência

O que era para ser uma noite de divertimento acabou em frustração para as jovens Gilvana França de Lima e Jo da Silva Lima, ambas de 19 anos. No último final de semana, elas resolveram ir em uma casa noturna de Cruzeiro do Sul, no interior do Acre, em que constava que homens deveriam pagar R$ 20 e mulheres tinham entrada gratuita.

Elas, que são mulheres transexuais, tiveram a entrada gratuita negada pelo dono da boate, que disse que elas não eram mulheres e, portanto, teriam que pagar. O g1 não conseguiu contato com o dono da casa noturna até esta publicação.

Ao terem a entrada negada, elas começaram a gravar a atitude do homem e, segundo Gilvana, ele pegou o telefone dela e o primeiro vídeo foi apagado. Na frente do estabelecimento, ela voltou a gravar a situação e uma equipe da Polícia Militar foi chamada pelo dono da boate.

boate 001 webPolicial que aparece em vídeo diz que jovens 'não são mulheres' e elas denunciam caso na Corregedoria — Foto: Reprodução

No vídeo, uma das meninas aparece contando o que tinha acontecido aos policiais. E, para a surpresa delas, um dos militares confirma o que o empresário está dizendo e fala que elas “não são mulheres”.

“Ele disse que não ia entrar porque eu estava disfarçada de mulher”, diz uma delas. E, um dos militares fala: “Mas, vocês não são mulheres, pessoal.”

Em outro momento, uma mulher que diz ser dona da casa noturna aparece no vídeo e uma das meninas pede que ela olhe e diga se está vendo um homem ou uma mulher e ela responde: “Mulher, vocês não são”.

No final do vídeo, o policial e o dono do local orientam que se elas tivessem se sentido prejudicadas que procurassem seus direitos.

boate 002 webGilvana e Jo foram informadas pelo dono da boate que teriam que pagar porque ‘não eram mulheres’ — Foto: Reprodução

Essa não foi a primeira vez que Giovana foi para aquela casa noturna e ela contou ao g1 que já tinha entrado sem pagar em dia de entrada grátis para mulheres, mas que dessa vez o dono negou.

“Ele que disse que para a gente entrar tinha que pagar, porque a gente não era mulher, que estávamos nos passando por mulher. Ele falou que ia ligar para polícia, a gente também ligou e quando a polícia chegou, foi isso que aconteceu no vídeo”, disse Giovana.

“Me senti muito constrangida, muito humilhada, porque tinha muita gente lá, todo mundo viu o que estava acontecendo. Foi o pior constrangimento que já passei. Quando a gente chama a polícia, acha que é para defender e estavam contra. Quem ia nos acolher naquele momento, já que a guarnição não estava?”.

Esse foi o mesmo sentimento de Jo. “Me senti muito constrangida, como se fosse uma palhaça para ele. O que exigíamos ali era respeito e não recebemos isso. Estamos com medo de andar pela rua depois do que aconteceu.”

Denúncia à polícia

As duas jovens registraram um boletim de ocorrência na Delegacia da Mulher, na cidade de Cruzeiro do Sul, e também vão levar a denúncia à Corregedoria da Polícia Militar para apurar a conduta dos policiais que aparecem no vídeo.

Para fazerem as denúncias, elas estão sendo acompanhadas pelo professor universitário, Everton Melo, que é membro do grupo de apoio à Comunidade LGBTQIA + do Centro de Referência em Assistência Social (Creas) em Cruzeiro do Sul.

“Quando a gente vê o vídeo, se revolta muito, porque lembramos de tudo que já passamos. Durante essa revolta, conversamos para ajudá-las, caso elas quisessem tomar providências e estamos acompanhando. Fomos na delegacia e nesta quinta [10] na Corregedoria e depois ir até a Justiça. Nosso medo é que tenha algum tipo de retaliação contra elas”, disse Melo.

A Polícia Militar do Acre informou que o caso ainda não chegou até a Corregedoria, mas que a abertura de procedimento apuratório é de praxe.

Ao g1, o delegado Rômulo Carvalho, titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher e ao Menor de Cruzeiro do Sul, disse que o procedimento ainda está sob investigação, que as vítimas foram ouvidas e que todos os envolvidos também devem ser ouvidos.

MP acompanha caso

O Ministério Público do Acre se manifestou sobre o ocorrido e disse que as duas jovens transexuais vão ser ouvidas pelo promotor de Justiça Ildon Maximiano nesta quinta-feira (10).

Conforme o órgão, toda forma de preconceito não pode ser admitida e o caso vai ser devidamente apurado.

“Para o Ministério Público do Acre práticas discriminatórias em função do sexo, gênero ou sexualidade do indivíduo não devem ser toleradas”, diz a nota.