Plataformas que monitoram concentração de poluentes no ar mostram que o índice teve melhora em relação a terça-feira (3), porém a capital acreana superou Porto Velho, em Rondônia, que costuma liderar o ranking. Especialistas alertam que contaminação pode causar problemas cardiovasculares
Em meio ao avanço da cortina de fumaça que cobre boa parte da Amazônia, Rio Branco teve melhora na média de concentração de material particulado em relação a essa terça-feira (3), porém tem o pior índice entre as capitais na manhã desta quarta-feira (4).
Medidores da plataforma IQAir registraram que o Índice de Qualidade do Ar (IQA) marcava 450 µg/m3 (microgramas por metro cúbico) por volta das 9h, chegando ao último grau de classificação da plataforma. A classificação varia entre “Bom”, “Moderado”, “Insalubre para grupos sensíveis”, “Insalubre”, “Muito insalubre” e “Perigoso”.
Ainda segundo o monitoramento, o índice é 60x maior que o recomendável pela OMS, que é de 15 µg/m3.
Com isso, Rio Branco ficou à frente de Porto Velho, em Rondônia, que costuma liderar o ranking. A capital rondoniense marcou índice de 390 µg/m3.
Outra plataforma que acompanha em tempo real a qualidade do ar em Rio Branco, Purple Air, mostra que dois dos três sensores instalados na capital acreana têm índices acima de 100 µg/m3.
Cancelamento de aulas
A piora da qualidade do ar em Rio Branco e em todo o estado se intensificou no mês de agosto e se mantém nos primeiros dias de setembro. Por conta da situação, a prefeitura de Rio Branco determinou a suspensão das aulas na rede pública municipal até esta sexta-feira (6), com possibilidade de prorrogação.
A medida afeta o ano letivo de pelo menos menos 22 mil estudantes nas 75 unidades escolares de 1º ao 5º ano, além de cerca de 16 creches, totalizando mais de 90 unidades. A população infantil está entre as mais sensíveis a problemas respiratórios e outros danos à saúde causados pela fumaça.
“Foi uma medida acertada, haja vista que já temos crianças com problemas nas nossas escolas, justamente pela fumaça que está aí. Além de outra crise gripal também que está dando”, disse Nabiha Bestene, secretária municipal de Educação.
A rede estadual não cancelou aulas, porém, a Secretaria de Estado de Educação (SEE-AC) confirmou a ‘suspensão temporária apenas das aulas que envolvem atividades físicas até que a qualidade do ar volte à normalidade’. A gestão, contudo, manteve a aulas teóricas nas escolas.
“A medida administrativa visa garantir o cumprimento do calendário escolar e evitar atrasos que possam prejudicar os alunos nas provas avaliativas, como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), até última deliberação”, destaca a nota assinada pelo gestor da pasta, Aberson Carvalho.
Desfile de 7 de setembro
O tradicional desfile de 7 de Setembro também foi suspenso por causa dos índices de poluição do ar. Durante o anúncio, feito nessa terça (3), o governador Gladson Cameli (PP) apresentou ainda ações emergenciais que devem ser tomadas pelo Executivo estadual para tentar conter os efeitos do problema.
“Eu preciso que a população entenda que vamos fazer tudo que podemos para tentar diminuir os prejuízos principalmente das crianças e dos mais idosos”, afirmou Cameli.
Entre as medidas anunciadas estão a liberação de servidores públicos acima de 60 anos de comparecerem ao trabalho presencial. Extensão do horário de atendimento das Unidades Básicas de Saúde até às 22h, que já havia sido anunciado mais cedo. Ainda devem ser abertas 10 novas vagas de leito no Hospital da Criança da capital.
Unidade de saúde especializada
Para reforçar o atendimento nas unidades hospitalares, a Saúde reativou a Unidade Sentinela na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Segundo Distrito de Rio Branco. Lá são concentrados todos os serviços referentes as síndromes gripais.
O aumento de registros de síndrome gripal e síndrome respiratória aguda grave (SRAG) ocorre devido à poluição do ar no estado acreano por conta das queimadas.
Caso o paciente busque atendimento em outro hospital com sintomas gripais, as equipes vão direcioná-lo para a Unidade Sentinela. Ainda segundo a gestora, as equipes também foram reforçadas nas demais unidades de saúde para ampliar os atendimentos.
Especialistas alertam
Em entrevista ao JAC 1, desta terça-feira (3), o cardiologista Odilson Silvestre, explicou que esse nível de poluição pode causar danos ao pulmão causando crises em quem já tem doenças crônicas, infarto e até a morte.
Índices acima de 250 µg/m3 são classificados como alerta para emergência em saúde. Na manhã desta terça, a qualidade do ar ultrapassou os 700 µg/m3 na capital do Acre. A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera aceitável 15 µg/m3.
O médico alertou sobre a fuligem que cobre o céu da capital. Ele frisa que a população ao respirar esse ar, não tem nenhuma filtragem importante externa, e esse ar, com todo o conteúdo de fuligem, carbono negro e alguns gases, vai direto para os pulmões causando danos ao organismo.
“Então vamos imaginar, o nosso pulmão: ele tem contato direto com o ar, então o que se espera é um ar limpo. Como esse ar tem material particulado, causa ali inflamação porque é um material que ele é alérgeno, então causa toda uma reação do nosso corpo. Inflama, causa inchaço e às vezes um pouco de acúmulo de água ali, que é justamente o inchaço”, afirma.
O material tóxico causa ainda danos ao sistema cardíaco, segundo Silvestre. “Na circulação a pressão sobe, às vezes o coração até acelera também e podem advir disso alguns eventos, até morte, infarto e crises em doenças que já são crônicas, inclusive”.
Com a baixa qualidade no ar, algumas pessoas podem sentir ainda diversos sintomas como: náuseas, dor de cabeça, falta de ar. Os grupos de risco, são os que mais sofrem desconforto nesse momento.
“Vale a pena a gente frisar, crianças em especial até os cinco anos, onde o sistema imunológico não está pronto e ele reage de formas acerbadas a essa exposição à fumaça, mas podemos estender até crianças até 10 anos, idosos com mais de 80 anos, pessoas que já têm asma, enfisema, bronquite, essas pessoas sem dúvida devem evitar exposição à fumaça, isso quer dizer ficar em casa, se sair de preferência usar uma boa máscara”, aponta Silvestre.
Orientações
- Evitar a exposição ao sol, se puder
- Estar bem hidratado
- Usar máscara (N95 de preferência) sempre que estiver ao ar livre
Para quem faz exercícios físicos, a instrução do cardiologista é para que sejam feitos em locais fechados. Ele aconselha evitar atividades ao ar livre para não inalar fumaça durante a atividade, já que é um risco a mais à saúde.
“É perigoso. Sem nenhuma dúvida, a pessoa está correndo um risco que ela poderia evitar. Então tentar fazer em academias, ambientes fechados, com ar filtrado. Mas se for feita essa escolha, realmente tem um risco e às vezes as pessoas vão justamente bem de manhã ou no final do dia, que talvez é o horário, quando nós temos acompanhado que é o horário que a poluição está em níveis mais altos do que durante o meio do dia”, comenta ele.
Sinais de alerta
Em relação aos sinais de alerta, o médico disse que quem já tem doenças preexistentes geralmente são os que apresentam pioras nos quadros e devem procurar ajuda médica.
“Se você saiu, teve uma exposição ou mesmo em casa, porque a fumaça de algum jeito vai entrar, mesmo que em menor quantidade, se piorou a falta de ar, esse é um sinal que a doença piorou. Para quem tem doença cardíaca, se tiver dor no peito, então talvez precise procurar ajuda hospitalar”, explica.