Iapen reuniu uma série de decretos que regem os direitos e deveres dos profissionais que atuam em unidades prisionais. Texto permite que agentes portem armas em locais com aglomeração de pessoas, mas veda consumo de substâncias que reduzem capacidade física, psíquica e motora
Em meio a polêmicas envolvendo policiais armados em festas e locais de aglomeração, o Instituto de Administração Penitenciária do Acre (Iapen-AC) publicou um decreto que regulamenta o porte de armas por policiais penais. O documento foi publicado nesta quarta-feira (25) no Diário Oficial do Estado e reúne uma série de diretrizes que regem os direitos e deveres dos profissionais que atuam no sistema carcerário do estado em relação ao acesso a armas de fogo.
Em agosto, uma audiência pública debateu a possibilidade de proibir agentes da Segurança Pública entrarem em locais de aglomeração armados.
Entre as principais definições, o texto permite que agentes portem armas em locais com aglomeração de pessoas, mas veda consumo de substâncias que reduzem capacidade física, psíquica e motora, além de determinar que conduzam a arma de maneira discreta, “visando evitar constrangimentos a terceiro”.
“Os Policiais Penais estão sujeitos a formação funcional, atestado de capacidade técnica e atestado de aptidão psicológica, estando também submetidos a mecanismos de fiscalização externa e de controle interno, para obtenção de porte e cautela de arma de fogo institucional”, diz o parágrafo único do documento.
Ainda conforme o texto, cabe à presidência do Iapen conceder ou indeferir pedidos de porte de arma aos agentes. A Corregedoria-Geral deve se manifestar dentro dos pedidos, e também fiscalizar o cumprimento das normas.
Para ter o porte de arma concedido, o agente precisa comprovar inexistência de condenação criminal, exceto as de menor potencial ofensivo e não estar cumprindo sanção de natureza administrativa, além de apresentar atestado de aptidão psicológica, e atestado de capacidade técnica.
“Policiais penais aposentados, para conservarem a autorização do porte de arma de fogo de sua propriedade, deverão submeter-se, a cada 10 (dez) anos, aos testes de aptidão psicológica”, acrescenta a portaria.
O porte de arma para policiais penais poderá ser cassado quando o agente:
- Deixar de comunicar sobre extravio, furto, roubo da arma de fogo, munições ou acessório;
- Portar a arma de fogo embriagado ou sob visível efeito de substâncias que causem dependência, ou que reduzam a capacidade física, psíquica ou motora;
- Efetuar disparo em via pública ou em qualquer outro local em desacordo com as normas técnicas e legislação vigente;
- Emprestar ou vender a arma de fogo de propriedade do Estado que esteja sob sua responsabilidade;
- Intimidar ou constranger pessoas, ainda que sem efetuar disparo, mesmo fora de serviço;
- Deixar de devolver armamento institucional a que tenha sido conferido apenas para a execução do serviço;
- For condenado em processo administrativo disciplinar ou processo judicial;
- Conduzir o armamento Institucional ou particular sem portar a documentação necessária;
- Estiver cumprindo prisão definitiva;
- Infringir dispositivo de lei, decreto ou regulamento inerentes às atribuições policiais, desde que não seja aplicável a suspensão.
Alguns casos
O Ministério Público do Acre (MP-AC) obteve decisão da Justiça acreana para que o policial penal Raimundo Nonato Veloso da Silva tivesse prisão preventiva decretada. Ele é acusado de matar o jovem Wesley Santos da Silva, de 20 anos, que morreu após ser atingido por um disparo de arma de fogo na madrugada do dia 7 de agosto, no último dia da Expoacre 2023.
Outro caso ocorrido fora do horário de trabalho foi do policial penal Alessandro Rosas Lopes, denunciado por matar o vendedor de picolé Gilcimar da Silva Honorato em dezembro de 2020 em Rio Branco. A PM-AC informou que o policial, que estava à paisana, parou em um bar do conjunto para comprar bebida, quando um homem pediu para ele comprar cachaça. Lopes se recusou e iniciou uma discussão entre os dois. Honorato entrou na discussão e os dois iniciaram uma luta corporal. O servidor público teria saído para a rua e foi perseguido pelo picolezeiro. O policial afirmou que percebeu que a vítima estava com uma faca, pegou o revólver no carro e atirou no picolezeiro, que morreu ainda no local. O processo segue em andamento e Lopes está preso.
O policial penal Quenison Silva de Souza também foi condenado por feminicídio. Teve a pena reduzida em mais de nove anos após entrar com pedido de anulação do julgamento que o condenou a 25 anos e 11 meses de prisão pela morte da companheira, Erlane Cristina de Matos. Com a nova decisão do último dia 27 de janeiro do ano passado, Souza deve cumprir 16 anos e sete meses de reclusão, em regime inicial fechado.
Em dezembro de 2020, a Justiça determinou que o policial penal perdesse seu cargo de servidor público do estado. A decisão foi assinada pela juíza Luana Campos da 1ª Vara do Tribunal do Júri.
Erlane foi morta com um tiro na cabeça em 11 de março de 2020 na casa do casal, no bairro Estação Experimental, na capital. O casal brigou depois de chegar da casa de um amigo. O policial foi condenado pelo crime de homicídio qualificado por motivo fútil e por feminicídio.
Audiência
Com tantos casos, em agosto deste ano, uma audiência pública na Assembleia Legislativa do Acre (Aleac) debateu o porte de armas de agentes de segurança pública em locais de festa e com venda de bebidas alcoólicas. O debate foi solicitado pelo deputado Adailton Cruz (PSB), que trabalha em um projeto de lei para proibir esse porte em ambientes festivos.
Participaram da audiência, parlamentares, representantes do Ministério Público do Acre (MP-AC), e representantes das polícias Militar, Civil e Penal. Durante a abertura da audiência pública, Cruz ressaltou que o objetivo é saber que tipo de legislações estão em vigor com relação ao direito ao armamento de agentes fora do expediente. O deputado afirmou que o objetivo é ouvir os agentes, e, se ficar esclarecido que há mecanismos suficientes de monitoramento e fiscalização, ele pode até desistir de apresentar o projeto de lei.
“Eu não sou contra o porte de arma para nenhum agente, seja no ambiente de serviço seja fora. Jamais iria trabalhar para que esse direito legal fosse furtado dos nossos agentes. No entanto, o que nos traz aqui ao debate, e eu jamais iria ser responsável de apresentar uma proposta de lei sem ouvir os responsáveis. Estamos aqui para discutir a disciplina e a regulamentação para usar armamento fora do expediente e em ambiente com consumo de álcool. Saber como isso está sendo comandado pelas corregedorias, saber se já existe disciplina, e se já existe, não iremos nos furtar de disciplinar. Porque eu vejo sempre o agente de segurança pública como um alicerce, não podemos ver com temor, com medo. Alguém bêbado com uma arma em punho ou na cintura, não transmite outra coisa que não medo”, destacou o parlamentar.
Pesquisa do MP
Uma pesquisa feita pelo Ministério Público do Acre (MP-AC), por meio da Promotoria Especializada de Tutela do Direito Difuso à Segurança Pública, mostra os resultados de uma pesquisa de opinião sobre o porte de arma de fogo por agentes de Segurança Pública durante o período de folga.
O estudo, foi feito em março deste ano e ouviu 385 pessoas, sendo 206 do sexo feminino (53,6%) e 179 do sexo masculino (46,6%). Porém, só foi divulgado na última quinta-feira (10).
Para a pesquisa, foi elaborada a seguinte pergunta: “Na sua opinião, um policial de folga pode andar armado em locais de aglomeração e consumir bebida alcoólica?”, podendo responder “Sim” ou “Não”. A maioria dos entrevistados, 96%, respondeu que Não.
Além disso, o levantamento também quis saber quais os locais onde a população considera que a combinação de porte de arma de fogo e consumo de bebida alcoólica, por parte de agentes de Segurança Pública, seja perigosa.
Os ambientes mencionados incluem baladas/boates, bares, vias públicas, festas privadas e chácaras. Para 72,2% dos participantes, todos esses locais representam uma combinação perigosa.