Caminhoneiros fizeram protesto em Assis Brasil, na fronteira do Acre com o Peru, para conseguir passar com cargas para o lado peruano. Grupo de imigrantes ocupa Ponte da União na tentativa de conseguir sair do Brasil
Caminhoneiros que estão tanto do lado brasileiro como do lado peruano, na fronteira do Acre com o Peru, protestaram nesta quarta-feira (24), na tentativa de conseguir seguir viagem com suas cargas.
Eles estão impedidos de atravessar porque a Ponte da União, que liga a cidade acreana de Assis Brasil ao Peru, está ocupada por imigrantes que tentam sair do país desde o último dia 14. A fronteira do Peru está fechada desde março para a entrada de estrangeiros por causa da pandemia do novo coronavírus. Mas caminhões com cargas podem entrar no país.
Pablo Cardoso, que é representante de um despachante aduaneiro e de uma distribuidora de combustível que fornece o produto para a Bolívia, disse que há pelo menos 37 caminhões no lado peruano com combustível para ser levado à Bolívia. Do lado brasileiro também há caminhoneiros que tentam sair do Acre.
“O que está acontecendo é que todos os caminhões estão presos por causa dos estrangeiros que estão na fronteira. É justo que eles façam sua reivindicação mas, fechar a ponte não é justo. Estamos com 37 caminhões do lado peruano carregados de combustível e mais uns dez do lado brasileiro querendo entrar na Bolívia para abastecer e não conseguem. O governo federal tem que resolver, queremos a abertura da ponte para que esses caminhões passem”, disse.
Carga de peixe avaliada em R$ 100 mil: ‘desesperado’
O caminhoneiro Adriano Braga disse que está há pelo menos cinco dias com uma carga de pescado avaliada em R$ 100 mil e teme que os peixes estraguem.
“Não podemos retornar com a carga, porque não temos autorização para tirar o lacre ou colocar gelo novamente. Não temos uma solução, já vai para o quinto dia. A carga é avaliada em torno de R$ 100 mil e o cliente está do outro lado, em Iñapari, no Peru, desesperado, sem saber o que fazer. Estamos prestes a perder a carga e correndo o risco de sermos multados por não termos um local adequado para descartar esse peixe”, desabafou.
O prefeito de Assis Brasil, Jerry Correia, disse que está ciente da situação, mas que a abertura da fronteira não depende dele.
“Estamos solidários, mas não é nossa competência. Desde o começo eu tenho mobilizado todos os órgãos. Veio aqui um aparato grande [governo federal], mas não resolveu o problema, imagina um município que está há pelo menos um ano nessa situação, uma cidade das mais endividadas, uma prefeitura que não tem pessoal nem para atender toda sua população. Hoje tem lá na ponte pelo menos 100 estrangeiros e não temos o que fazer”, falou.
O gestor disse que vai entrar com uma ação no Ministério Público Federal (MPF) para tentar resolver o problema ou pelo menos tirar os estrangeiros de cima da ponte.
“Estou entrando com uma ação no MPF, estamos pedindo a desocupação. Aqui em Assis Brasil não temos nem abrigos, as escolas são usadas como abrigos e estão sendo deterioradas. Vamos pedir para que o MPF entre nessa causa e determine que essas pessoas saiam de cima da ponte.”
O secretário Nacional de Assistência Social, do Ministério da Cidadania, Miguel Ângelo Gomes, esteve no dia 19 deste mês em Assis Brasil para ver de perto a situação dos imigrantes que estão no município acreano e tentam atravessar a fronteira para deixar o Brasil.
O representante do governo federal se reuniu com o governador da Província de Madre De Dios, Luis Guillermo Hidalgo Okimura, e o prefeito de Iñapari, Abraão Cardoso. Na conversa, segundo a Agência do Governo do Acre, as autoridades peruanas informaram que o país avalia uma forma de abrir a fronteira para liberar a passagem dos imigrantes, mas que, por enquanto, a fronteira no lado peruano segue fechada.
Ainda ao portal do Governo do Acre, o secretário Nacional de Assistência Social reconheceu que o problema precisa ser resolvido de imediato, por se tratar de uma situação diplomática, mas não disse como o governo federal deve resolver a situação diplomática, mas não disse como o governo federal deve resolver a situação.
Situação em Assis Brasil
Em Assis Brasil, no interior do Acre, cerca de 100 imigrantes que foram impedidos de entrar no Peru continuam acampados na Ponte da Integração, e mais de 250 estão nos dois abrigos da cidade. Na segunda (22), um grupo com 20 imigrantes chegou na cidade na tentativa de atravessar para o país vizinho, segundo o prefeito.
Os imigrantes chegaram em cinco táxis lotados e, como a fronteira com o Peru segue fechada, não conseguiram seguir viagem, assim como os demais que continuam na cidade. O Grupo Especial de Fronteiras (Gefron) disse que esses imigrantes saíram de São Paulo, pegaram um voo até Rio Branco, onde pegaram os táxis até Assis Brasil.
Já são quase dez dias que a tensão na fronteira tem aumentado, porque imigrantes, em sua maioria haitianos, tentam atravessar para o Peru.
Policiamento
Além dos policiais do Batalhão de Choque da Polícia Militar e do Gefron, mais de 12 militares da Força Nacional e mais de 20 policiais rodoviários federais fazem o policiamento na região de fronteira.
Uma portaria do Ministério da Justiça e Segurança Pública, publicada no dia 18, autorizou o emprego da Força Nacional no Acre, no apoio às forças policiais no estado. A autorização é válida por 60 dias e pode ser prorrogada.
A determinação estabelece que as Forças Nacionais devem auxiliar “nas atividades de bloqueio excepcional e temporário de entrada no País de estrangeiros, em caráter episódico e planejado”.
Testagem de Covid
Após uma imigrante testar positivo para Covid-19, a prefeitura de Assis Brasil se prepara para fazer a testagem dos quase 300 imigrantes que estão na cidade tentando atravessar a fronteira do Acre com o Peru.
“Recebemos testes do governo e junto com os técnicos da saúde do governo estamos preparando um plano de testagem. Temos dois problemas; primeiro a resistência deles, e a gente não pode forçar e segundo que nós não temos, em eventuais casos positivos, onde colocar e isolar. Já falei isso até com a presença do representante do governo federal. Não temos suporte médico suficiente nem para a população”, disse.
Uma haitiana de aproximadamente 35 anos foi levada para o hospital regional de Brasileia, e agravou o quadro e foi transferida para Rio Branco.
A Secretaria Estadual de Saúde (Sesacre) informou que o estado ofertou 600 testes que estão sob responsabilidade da unidade estadual mista de Assis Brasil e serão disponibilizados ao município após a entrega do plano ao Comitê Operacional de Emergência da secretaria. Para isso, o município precisa elaborar um plano de testagem, considerando que não pode ser em massa, uma vez que a doença tem o tempo de janela imunológica para aparecer no teste rápido.
A secretaria informou ainda que orientou o município para que a testagem não seja no abrigo e nem nas unidades sentinelas para Covid. Na intenção de não misturar os usuários do SUS. Além disso, a testagem também deve funcionar como um cadastro dos imigrantes.
O imigrante novo que chegar, ao solicitar acesso ao abrigo, deverá ser direcionado ao centro de testagem e atendimento médico ao imigrante para que, de acordo com a triagem e, se houver necessidade do teste rápido, esse imigrante tenha um destino correto, sem possibilidade de contaminar os imigrantes já alojados.
Ocupação
A situação dos imigrantes começou a ficar tensa desde o dia 14 deste mês, quando cerca de 400 imigrantes deixaram os abrigos que ocupavam e se concentrarem na Ponte da Integração, na fronteira com o Peru. Os imigrantes tentavam deixar o país, mas foram barrados pelas autoridades peruanas.
No dia 16, os imigrantes enfrentaram a polícia peruana e invadiram a cidade de Iñapari, no lado peruano da fronteira. Depois de confronto, o grupo foi reunido pelos policiais peruanos e mandado de volta para Assis Brasil.
A cidade de Assis Brasil registrou até esta quarta (24), 1.064 casos de Covid-19. De acordo com o boletim da Sesacre, o município tem a maior taxa de contaminação pela doença no estado com 1.412 caos a cada 10 mil habitantes.
Rotas
São duas situações que fazem com que o número de imigrantes cresça na cidade de Assis Brasil; a primeira, a de imigrantes que entraram no Brasil entre 2010 e 2016 em busca de uma vida melhor e, com a crise da pandemia, tentam sair do país para seguir viagem até México, Canadá, Estados Unidos e outros países.
A segunda é que o Peru, mesmo fechando a passagem para a entrada de imigrantes, libera a saída deles para o lado brasileiro, então é uma porta de entrada para venezuelanos.