Seis ministros votaram a favor da venda da estatal, enquanto um divergiu do relator; governo quer privatizar empresa até maio
Por maioria dos votos dos ministros, o Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou nesta terça-feira (15) a primeira e mais importante fase do processo que analisa a privatização da Eletrobras, que o governo pretende realizar até maio deste ano.
Foram 6 votos a favor da posição do governo e uma manifestação contrária. Apenas sete ministros votam neste processo, mesmo o TCU sendo composto por nove ministros. A presidente da Corte, Ana Arraes, está de férias. Em seu lugar, o ministro Bruno Dantas só vota em caso de empate, o que não ocorreu.
Os termos aprovados pelo tribunal, na avaliação do governo, não impedem a privatização da estatal, como temiam integrantes do Ministério da Economia e do Ministério de Minas e Energia.
No total, o governo calculou em R$ 67 bilhões os valores relacionados à privatização da Eletrobras. Desse valor, R$ 25,3 bilhões serão pagos pela Eletrobras ao Tesouro Nacional pelas outorgas das usinas hidrelétricas que terão os seus contratos alterados.
Serão destinados ainda R$ 32 bilhões para aliviar as contas de luz a partir do próximo ano, por meio de fundos do setor elétrico, a Conta de Desenvolvimento Energética (CDE).
Outros R$ 2,9 bilhões serão destinados para bancar a compra de combustíveis para a geração de energia na região Norte no país, onde algumas cidades não são ligadas ao sistema nacional de energia.
O restante será destinado para revitalização de bacias hidrográficas do Rio São Francisco, de rios de Minas Gerais e de Goiás, e para a geração de energia na Amazônia.
As discussões do tribunal nesta terça giram em torno desse valor, ao definir os parâmetros de preço das outorgas. Ou seja, quanto vale as hidrelétricas que serão concedidas junto com a estatal. Para o mercado, o valor de R$ 67 bilhões já está alto e qualquer reavaliação para cima pode inviabilizar o processo.
O ministro Vital do Rêgo, que havia pedido mais tempo para analisar o caso em dezembro, contestou em seu voto esses valores. O ministro apontou que os valores definidos pelo governo estão subestimados porque, para ele, é necessário considerar a potência total das hidrelétricas. Essa posição, para o governo, inviabiliza a privatização da estatal.
O sistema elétrico, porém, trabalha considerando a geração média das usinas, e não a sua potência. Portanto, as hidrelétricas são remuneradas por essa média, e não pelo todo. O governo argumenta que é preciso considerar o valor médio, e não há regra hoje no país para a venda da capacidade (ou da potência do sistema).
A própria área técnica do tribunal afirmou nos autos do processo que o correto é precificar os ativos com base na geração média. Por isso, a área técnica do TCU havia concordado com os valores definidos pelo governo.
Rêgo também contestou as regras sobre o risco hidrológico (relacionado à falta de chuvas) e de hedge do setor elétrico, ambas com normas definidas em lei. Com base nesses parâmetros, o ministro apontou que o valor da outorga da Eletrobras estaria subestimada em R$ 63 bilhões.
“Destaco que a subavaliação passaria dos R$ 63 bilhões se comparado ao valor publicado (pelo governo). Repito: estamos falando de uma possível subavaliação de nada mais nada menos do que R$ 63 bilhões”, disse.
Relator do processo, o ministro Aroldo Cedraz já havia votado a favor da posição do governo federal, assim como o ministro Raimundo Carreiro, em dezembro. Carreiro deixou o TCU para ser embaixador do Brasil em Lisboa, mas já havia votado.
O ministro Benjamin Zymler discordou, nesta terça, do voto de Vital do Rêgo e votou para manter a precificação em R$ 67 bilhões, formando maioria pró-governo.
Para Zymler, não existe regra para precificação de potência das usinas e, portanto, não é possível capturar esse valor. Ele sugeriu, porém, que os contratos de concessão das usinas condicione a venda futura de lastro de potência à celebração de aditivos contratuais que assegurem a devida remuneração à União por esse novo produto.
O ministro Walton Alencar Rodrigues também votou a favor da posição do governo e defendeu a privatização.
“Considero eu que o pior cenário possível é o sucateamento da capacidade geradora do país. O racionamento de energia, fronteiras do qual já chegamos, é o primeiro passo da fuga da indústria. Não podemos correr o risco da falta de energia no Brasil. Essa modelagem não pode ser questionada pelo Tribunal de Contas da União”, disse Alencar.
Augusto Nardes também votou com o relator, contra Vital do Rêgo. Ex-ministro do governo Jair Bolsonaro, Jorge Oliveira também votou a favor da privatização.
Capitalização
A desestatização da maior empresa de energia da América Latina depende do tribunal para seguir adiante. A previsão do governo é fazer a operação até maio.
Caso a privatização da Eletrobras seja aprovada, o governo poderá fazer a operação em maio. Contudo, a segunda etapa do processo, que trata da modelagem, do formato da capitalização, terá ainda que ser apreciada pelo TCU. A Corte decidiu separar as fases diante da complexidade da operação.
O modelo da privatização prevê transformar a companhia em uma corporação, sem controlador definido, após uma oferta de ações que não será acompanhada pela União. Sem acompanhar a capitalização, o governo tem sua participação diluída para menos de 50% e perde o controle das empresas.
O segundo processo irá analisar a reorganização societária e a precificação das ações.