Presidente da República colocou sob suspeita o sistema eleitoral brasileiro
Pessoas que integraram o governo em momentos diferentes, como ex-ministros e ex-embaixadores, criticaram fortemente o comportamento do presidente Jair Bolsonaro durante a reunião de segunda-feira com cerca de 70 embaixadores. A conclusão é que, ao colocar novamente sob suspeita o sistema eleitoral brasileiro, Bolsonaro deu mais um passo para piorar ainda mais tanto a sua imagem, como a do Brasil no exterior
Para Sérgio Amaral, ex-embaixador nos EUA e ex-ministro de Indústria e Comércio, a imagem do Brasil no exterior já estava bastante ruim pelas reiteradas violações das políticas ambientais e do combate às mudanças climáticas, com o aumento significativo do desmatamento na Amazônia. Segundo ele, a forma como o mundo vê o Brasil ficou ainda pior, com o assassinato de dois defensores da causa indígena, o jornalista britânico Dom Phillips e o indigenista Bruno Pereira.
“Agora, o presidente convoca dezenas de embaixadores estrangeiros para assistir a uma apresentação de acusações infundadas de uma possível fraude nas próximas eleições, o que apena corrobora as suspeitas da opinião publica interna e internacional de que, na linha de Trump [Donald Trump, ex-presidente americano que perdeu a eleição para Joe Biden], Bolsonaro prepara uma farsa na contestação do resultado das eleições e da própria democracia. A imagem vai piorar, com grandes prejuízos para o pais”, alertou Amaral.
O ex-chanceler Celso Amorim lamentou o envolvimento do Ministério das Relações Exteriores no que ele chamou de “farsa”.
“Um espetáculo vergonhoso, na forma e no conteúdo. Triste ver o Itamaraty se prestar a fazer o papel de coadjuvante nessa farsa”, afirmou.
Marcos Caramuru, ex-secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda e ex-embaixador na China e na Malásia, afirmou não acreditar que o mundo se surpreenda com mais uma ação insensata de Bolsonaro, “na linha do trumpismo e da cartilha da direita norte-americana”. Para Caramuru, a imagem do governo e, por extensão, do país apenas ganha um novo aspecto mais risível.
“A reunião foi algo entre o ridículo e o desastroso. O melhor que podemos esperar é que as reações negativas no Brasil também mereçam alguma consideração pelos que acompanham a nossa realidade”.
Aloysio Nunes, ex-ministro das Relações Exteriores, disse que, com a reunião de segunda-feira, Bolsonaro contribuiu para consolidar sua condição de pária internacional.
“As pessoas razoavelmente informadas sabem distinguir o Brasil do político tosco, demagogo e extremista chamado Bolsonaro. Sua imagem dificilmente poderia ficar pior, mas a patacoada delirante de ontem deu uma poderosa contribuição para consolidar sua condição de pária internacional”.
Ex-embaixador do Brasil nos EUA, Rubens Barbosa afirmou que a reunião de ontem foi algo inusitado. Nunca aconteceu algo parecido neste país.
“Não dá para piorar mais do que já está”
Hussein Kalout, ex-secretário de Assuntos Estratégicos e atualmente pesquisador em Havard e membro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), destacou que Bolsonaro, basicamente, disse que o processo que o elegeu presidente da República, em 2018, é fraudulento. E, se o presidente não for reeleito pelo próprio processo que o elegeu, ele não aceitará o resultado e, portanto, pode romper com a ordem constitucional.
“Achei lamentável e degradante o discurso de Bolsonaro. De fazer tremer de vergonha o hino nacional brasileiro”.