O ex juiz e ex-ministro Sérgio Moro é uma figura e tanto. Não erra jamais. Seu truque é usar o Fator Target – primeiro atira a flecha. Depois pinta o alvo. Pronto.
Depois de tudo o que fez - agiu deliberadamente para derrubar uma Presidente e usou de ilicitudes para prender outro ex-Presidente - o ex-juiz e ex-Ministro do Governo Jair Bolsonaro (ele quer esconder isso) agora quer agir como democrata.
Age como outsider, tentando aquilo que jamais a filosofia conseguiu: sair de um paradoxo como o Liar Paradoxe (paradoxo do mentiroso): todos os que estão nesta sala são mentirosos; eu estou na sala; logo, também sou mentiroso; assim, se o contrário da mentira é a verdade, acabo de cair em um paradoxo (dele só se sai pela linguagem lógica). Com isso, substitua-se “sala” por “governo” e teremos o “Paradoxo Moro”.
Segundo entrevista do dia 6.6.2020, deseja até mesmo aderir aos movimentos pró-democracia. Ou seja, Moro constrói a bastilha e depois escreve um texto contra a pena de morte.
Parece querer que esqueçamos que o bolsonarismo é filho legítimo (de pai e mãe) do lavajatismo. Assim, quem sabe, pretenda esconder suas próprias responsabilidades em relação ao caos em que estamos mergulhados.
Moro é o Barão de Münschausen da política brasileira (e do direito): afundando no pântano do descrédito com seu cavalo, quer salvar-se puxando-se pelos próprios cabelos.
A questão é que todos (pelo menos uma boa parcela da população) já sabem que sabem o que Moro fez. E isso é imperdoável. Todos sabemos que o ele fez nos verões, outonos, primaveras e verões passados, conjuminando-se com a Força Tarefa da lava jato, chefiando operações, atravessando ordens judiciais quando de férias, vazando delações premiadas e liberando gravações ilícitas. Esse é Sérgio Fernando Moro. Esculpido em carrara.
Ele diz que na democracia, as questões pessoais devem ser deixadas de lado. Ora, como juiz, ele não fez isso. Como Ministro da Justiça, assistiu, calado, um colega seu dizer que os onze ministros do STF - lugar para onde queria ir – eram vagabundos e deveriam estar presos. E o que fez Moro? Quedou-se silente. Fez-se estátua. Deve ser algo como “ministros do STF, nada pessoal, mas estou no governo e, sabem como é...”.
E não adianta dizer que no dia seguinte pediu demissão. Sabe-se por que pediu exoneração. O próprio Presidente Bolsonaro sabe. Todos sabem.
Além de tudo, nosso Barão de Münschausen é craque em trocar o nome das coisas: parcialidade é justificada pelos fins que justificam os meios. E um motim no Ceará ganha, no neonominalismo de Moro, o nome de “greve”. Passar por cima do devido processo legal vira “rule of law” (em inglês, mesmo).
Moro diz que Bolsonaro tem arroubos autoritários. Bom, diz-nos com quem andas e te diremos se podemos andar contigo. Nada de novo. Moro, quando entrou no governo, não conhecia o curriculum de Bolsonaro? Ou, tanto mais óbvio, ao retirar de forma deliberada o franco favorito do último pleito presidencial, condenando-lhe sem provas a uma prisão injusta e arbitrária, não podia realmente prever o que disso decorreria?
Moro acusa o Presidente de ter retirado os radares e isso causou o aumento de número de mortos nas estradas. Diz que “isso é populismo e um quê de autoritarismo”. Então, podemos concluir: se o Ministro da Justiça e Segurança Pública sabe que uma medida do governo causará mortes e nada faz, qual é o nome que se dá a isso?
Pode-se chamar de leniência, interesses pessoais, desejo de não se incomodar, mas há coisas no Código Penal que dão nome a isso. Moro diz que não concordou com o Presidente. Mas, como Ministro da justiça, não deveria ter agido? As pessoas que sofreram acidentes e os familiares dos que morreram por causa da retirada dos controladores de velocidade podem, baseadas na entrevista de Moro – que acusou Bolsonaro de populista e autoritário - processar a União. Mais uma vez, Moro sabia.
Até mesmo o Gabinete do Ódio, segundo a entrevista, não era do desconhecimento de Moro quando Ministro da justiça. E, de novo, nada fez. Nem mandou investigar. Quantas reputações foram destruídas pela inércia do então Ministro?
E os massacres nos presídios? E o massacre em São Paulo na comunidade Paraisópolis? Como já disse o Ministro Gilmar Mendes, Moro “não deixou nenhuma marca no Ministério da Justiça, foi uma trajetória medíocre. A mim parece que, de fato, ele veio para uma Champions League, mas estava qualificado para campeonato do interior”. Nada mais precisaria ser dito.
Ou seja, Moro foi um juiz parcial e um ministro leniente. Diz que fez tudo pelo bem do país. Correto. Vamos dar de barato que Moro venceu. E venceu como o general Pirro, que, às portas de Roma, olhou para trás e viu suas tropas em frangalhos. Dizemos nós: mais uma vitória como a que Moro proporcionou até hoje no país e será o fim do que resta. Se as vitórias são essas, imaginem as derrotas quando vierem.
Nosso Barão se segura nos próprios cabelos. Só não se sabe se o cavalo virá junto.
Lenio Streck, jurista e Marco Aurélio Carvalho, advogado
Fonte: https://www.brasil247.com