..::data e hora::.. 00:00:00

Artigos

23.1 digital master pmrb iptu premiado 2025

Senado tem dever de barrar PEC da Blindagem

Senado tem dever de barrar PEC da Blindagem

Motivos não faltam para o Senado rejeitar ou engavetar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Blindagem, aprovada na Câmara. A PEC abre caminho à impunidade no Congresso. Ao exigir licença da respectiva Casa para abertura de processos criminais contra parlamentares e ao incluir os presidentes de partidos políticos entre os submetidos ao foro do Supremo Tribunal Federal (STF), o texto tira do Judiciário autonomia para julgá-los. Na prática, transforma os ocupantes de cargos eleitos em cidadãos acima da lei. Basta lembrar que, ao longo dos 13 anos em que vigorou regra semelhante, apenas um parlamentar foi processado.

Felizmente o senador Otto Alencar (PSD-BA), presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, declarou que a PEC não passará “de jeito nenhum”. Mas é preciso que as lideranças da Casa tenham o bom senso de lhe fazer coro. O texto aprovado pelos deputados é indefensável. Trata-se de um caso típico de legislação em causa própria. Enquanto todos os demais brasileiros seguem sob o império da lei, os congressistas poderão contar com a compreensão dos colegas de trabalho e driblar qualquer ação penal.

A PEC também determina que parlamentares só poderão ser presos em flagrante em caso de crime inafiançável. Se acontecer uma prisão, os autos deverão ser enviados em 24 horas ao Supremo e ao Congresso. Câmara ou Senado terão de aprovar ou rejeitar a prisão por maioria absoluta em até 90 dias. A votação será secreta, incentivando a leniência. Se a autorização for negada, o parlamentar pego em flagrante ficará solto até o fim do mandato. Difícil pensar em regra mais favorável à impunidade. Além disso, instâncias inferiores não poderão mais expedir medidas contra parlamentares em processos civis, como bloqueio de bens em casos de improbidade administrativa.

O presidente da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), tentou como pôde justificar o injustificável. Mencionou compromisso com a autonomia dos mandatos. Ora, a PEC nada tem a ver com a independência dos congressistas. Parlamentares de todas as linhas políticas contam com amplos direitos para defender as ideias que quiserem, e seu discurso é protegido pela Constituição. A preocupação com a liberdade parlamentar, resultado da reação ao período da ditadura militar, criou não apenas a imunidade que vigorou de 1988 a 2001, mas também impunidade. Hoje o argumento de Motta é ainda mais descabido. Com o crime organizado faturando bilhões e marcando presença no Legislativo, é uma irresponsabilidade apostar em barreiras ao alcance da lei. Sem falar nas suspeitas de corrupção envolvendo emendas parlamentares.

A PEC da Blindagem não é a primeira a afrontar a lógica e também o interesse dos brasileiros. “Imprescindível para a democracia, o Congresso precisa demonstrar que não é útil apenas para si. Sem isso, põe em risco a própria democracia”, escreveu o cientista político do Insper Carlos Melo em artigo no GLOBO. “Conforma-se uma maioria devastadora, autônoma em relação à sociedade, crente de que seu poder se sobrepõe à própria Constituição, alvo recorrente de ameaças feitas em nome da conveniência dessa maioria.” Para resguardar o Congresso de um vexame, os senadores deveriam dar um fim à ideia de transformar o Parlamento em refúgio para criminosos.

Editorial do jornal O Globo de 18.09.2025

Fonte: https://oglobo.globo.com/