O que a última pesquisa Ipec mostra é que houve uma leve melhora de Jair Bolsonaro (PL) em vários indicadores até 29 de agosto, mas as ações e o histórico do presidente parecem ter neutralizado, desde então, os muitos esforços para torná-lo competitivo eleitoralmente e reverter sua rejeição.
A estagnação da lenta melhora de Bolsonaro se deu depois do até aqui único debate presidencial de que participaram ele e o líder nas pesquisas, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no qual o presidente deixou a estratégia de associar o petista à corrupção de lado para atacar mulheres — jornalista e candidatas.
Desde então, outros reveses se apresentaram para a campanha à reeleição do presidente. Aa despeito da redução dos preços dos combustíveis, tão alardeada, se mantém alta a inflação de alimentos.
Bolsonaro apostou tudo no aumento de 50% do Auxílio Brasil e prometeu manter o benefício, mas mandou o Orçamento ao Congresso sem garantir o valor; além disso, outros programas sociais como Farmácia do Povo e Casa Verde e Amarela tiveram cortes de recursos.
Discurso sobre corrupção
A revelação, pelo UOL, do patrimônio imobiliário construído pelo clã Bolsonaro, em parte em dinheiro vivo, abalou ainda mais o já comprometido discurso de que não há corrupção no governo.
Diante desses acontecimentos, o presidente apostou tudo no 7 de Setembro, que também não parece ter surtido o efeito desejado de libertar um certo voto envergonhado ou renitente.
O que o Ipec mostra, sobretudo depois da virada de agosto para setembro, é a consolidação da liderança de Lula, que vem fazendo uma campanha cerebral, calculada para, a cada etapa, gerar fatos positivos que acalmem o mercado financeiro e o setor produtivo (industrial e do agro) e consolidar a percepção de que constrói em torno de si uma frente ampla.
A investida de Bolsonaro de um discurso feroz de fake news anti-Lula junto ao público evangélico foi eficaz: o presidente lidera com larga margem nesse segmento. Mas parece ter gerado um “efeito rebote” no eleitorado católico, que crava, segundo o Ipec, 53% de votos no petista.
Entre as mulheres, a vantagem de Lula sobre Bolsonaro vai a 23 pontos. O petista também alarga a vantagem entre os mais pobres, no Nordeste, entre pretos e pardos e no segmento dos menos escolarizados. Bolsonaro cresce entre os que têm ensino superior.
Os ganhos eventuais de Bolsonaro em grupos específicos não subsistem diante do incremento em sua rejeição, de 46% para 50% desde que o Ipec passou a divulgar levantamentos semanais, em 15 de agosto.
Restam poucas alternativas
O problema para o presidente é que restam poucas cartas na manga de agora em diante. Até a questionável viagem ao exterior na reta final da campanha parece ter sido um tiro que saiu pela culatra, uma vez que, enquanto o presidente quebrou vários protocolos do funeral da rainha Elizabeth 2ª e ainda recebeu nova decisão da Justiça Eleitoral contrária à sua campanha, Lula aproveitou para avançar na pregação pelo voto útil e produziu um encontro com oito outros ex-candidatos a presidente de diferentes ideologias reunidos em torno de sua candidatura, alguns deles ex-opositores bastante vocais.
De agora em diante, Lula deve intensificar essa construção. A chegada de Henrique Meirelles ao barco pode ajudar a quebrar a resistência ao petista junto ao PIB, que ainda está majoritariamente com Bolsonaro, o que poderia drenar votos diretamente do presidente para seu adversário, algo que até aqui não se viu.
Da mesma forma, os acenos na direção de apoiadores e eleitores de Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB) podem surtir efeito na reta final da campanha, como se viu em 2018.
Diante desse movimento, Bolsonaro e ministros tendem a intensificar ataques a institutos de pesquisas, e o presidente vai voltar com tudo a questionar a Justiça Eleitoral, o que já recomeçou a fazer em Londres.
Vera Magalhães, jornalista
Fonte: https://oglobo.globo.com