Ainda está por se ver o rumo que o apequenado PSDB irá tomar, mas a convenção nacional da sigla nessa quinta-feira não deixou dúvidas sobre quem está com o controle: o deputado federal Aécio Neves (MG). Foi ele o autor da costura que colocou o ex-governador de Goiás Marconi Perillo na presidência nacional da sigla, no lugar do presidenciável Eduardo Leite, governador do Rio Grande do Sul. Leite resistia a Marconi, que apoiou o ex-governador paulista João Doria na disputa interna pela candidatura presidencial no ano passado, mas não conseguiu viabilizar um nome próprio. A alternativa do gaúcho, o ex-governador cearense Tasso Jereissati, não era aceita pelo grupo do parlamentar mineiro.
Leite foi reverenciado como candidato a presidente por praticamente todos os oradores do evento em que Aécio nem sequer discursou, mas o fato é que fracassou como dirigente nacional do PSDB. Ele assumiu a presidência da sigla em janeiro, mas a falta de uma reestruturação do diretório paulista inviabilizou sua gestão, segundo apoiadores do próprio governador gaúcho. Somente a 72 horas do fim de sua presidência Leite destituiu a direção estadual do PSDB em São Paulo, removendo o ex-deputado estadual Marco Vinholi, ligado a Doria, e colocando provisoriamente à frente da seção paulista o prefeito de Santo André, Paulo Serra.
Os apoiadores de Doria no PSDB paulista nunca aceitaram Leite como presidente e foram à Justiça para forçar o seu afastamento. Antes de uma decisão judicial final, o gaúcho concordou em sair. Doria se diz afastado da política e do PSDB. O ex-governador goiano deve fomentar a retomada do diálogo dentro da sigla, mas em bases diferentes das que havia antes da ruptura entre o núcleo paulista e o de Leite e Aécio.
A interlocutores, Aécio diz que a subordinação da direção nacional da sigla aos interesses do grupo político de São Paulo está na raiz da péssima eleição que o partido fez em 2022. Houve, na visão que compartilhou com aliados, uma perda de controle do processo.
Na visão do entorno do mineiro, o partido passou a priorizar a reeleição de Rodrigo Garcia em São Paulo. Garcia era vice de Doria e assumiu o cargo quando o titular se desincompatibilizou para ser candidato a presidente, mas tinha como estratégia de campanha não se vincular a nenhuma candidatura ao Planalto no primeiro turno. Doria desistiu de ser candidato, mas a posição de seu substituto tornou impraticável o lançamento de outro nome pelo PSDB. Derrotado, Garcia bandeou-se para o lado do ex-presidente Jair Bolsonaro, sem esperar uma posição nacional da legenda.
Depois da eleição o PSDB paulista passou a viver um processo de desmanche, com centenas de prefeitos abandonando a sigla e migrando para a base de partidos do novo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. Ainda assim, o grupo de Leite nunca chegou nem perto de controlar o diretório estadual.
A questão paulista não foi a única a afastar Leite da direção nacional. Segundo dirigentes do partido, pesaram também as circunstâncias de governar um Estado em dependência crescente de colaboração com o governo federal, até mesmo em função das catástrofes climáticas desse ano. E para o PSDB se autoafirmar, segundo comenta Aécio, é preciso estar inequivocamente na oposição. Com Marconi no comando, é previsível que o partido se torne mais agressivo em relação ao Palácio do Planalto.
É dentro dessas premissas que Aécio deve começar a construir um novo projeto de poder em Minas Gerais, remontando os cacos da sua biografia. Depois da derrota ao tentar a Presidência em 2014, Aécio teve a sua imagem pública destruída ao ser envolvido nos escândalos da JBS e da Lava-Jato. Foi absolvido dos processos que respondia em julho, mas ainda evita exposição na cena nacional.
A crise da dívida mineira dificulta ao governador Romeu Zema fazer seu sucessor em 2026, abrindo uma janela para Aécio tentar se recolocar. O tucano aproveitou a brecha na semana passada, ao apresentar uma proposta própria para garantir a solvência do Estado sem privatização dos ativos ou transferência deles para a União.
A iniciativa tem pouca chance de prevalecer sobre a alternativa negociada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) diretamente com Zema e com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas sinalizou que o tucano se volta para o próprio Estado. Perguntado se pretende disputar novamente o governo de Minas Gerais, sinalizou que está trabalhando para isso, usando os despistes clássicos dos manuais da política, que já não despistam ninguém.
César Felício, jornalista
Fonte: https://valor.globo.com/