Em Orlando, Bolsonaro chorou de inveja ao ver as imagens da festa que empossou Lula (este também chorou, mas de emoção). Difícil destacar um só momento: praça dos Três Poderes com lotação máxima, desfile em carro aberto, subida da rampa, aparato de segurança à americana, discurso inteligível, entrega da faixa e, não por último, show de Pabllo Vittar.
Antes, na noite do último dia de 2022, Bolsonaro já havia chorado de raiva ao saber que Hamilton Mourão, o vice-presidente que assistiu inerte à invasão da Amazônia por garimpeiros, grileiros e traficantes, usou a cadeia nacional de rádio e televisão para criticar “lideranças que deveriam unir a nação”, mas criaram um “clima de caos” e fomentaram um “pretenso golpe”.
Na tentativa de limpar a barra das Forças Armadas e cacifar-se como líder da reação conservadora, o general Mourão jogou a culpa no colo do capitão turista, pedindo aos cidadãos que voltem à “vida normal e cotidiana”. Ali, faltando poucas horas para a queima de fogos do Ano-Novo, o governo eleito em 2018 se despediu de fato, sem conseguir esconder sua degeneração.
Bolsonaro choramingou na live do adeus. Apesar da canastrice, foi a lágrima mais sentida e verdadeira. Lágrima que simbolizou a derrota do projeto de extrema direita que norteou todos os seus atos na Presidência, a obsessão de tornar-se um ditador destruindo as instituições do país. Ele próprio se entregou ao desculpar-se com os “patriotas” por não ter conseguido apoio para dar o sonhado golpe militar após as eleições: “Como foi difícil ficar dois meses calado trabalhando para buscar alternativas”.
Não se sabe quanto tempo vai durar o período de chinelão na Flórida, para onde fugiram no passado o cubano Fulgencio Batista e o nicaraguense Tachito Somoza. Os dois eram consumados ditadores, ao contrário de Bolsonaro, que fracassou em seu objetivo. Mais motivos para choradeira.
Alvaro Costa e Silva, diplomata, poeta, ensaísta, memorialista e historiador
Fonte: https://www.folha.uol.com.br