A Abin do governo Jair Bolsonaro tinha um guichê especial a serviço de quase todos os crimes atribuídos ao grupo do então presidente. Numa estrutura que não era nada “paralela”, servidores que davam expediente na agência ajudavam a turma a intimidar autoridades, fugir de investigações e atacar as eleições.
O trabalho de espionagem apareceu primeiro no varejo da delinquência política do governo. As apurações mostraram que um núcleo da Abin monitorava desafetos, como o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Segundo o relatório da PF, a ordem neste caso partiu do chefe da agência, Alexandre Ramagem.
O mesmo departamento abastecia as chamadas milícias digitais, que atuavam para destratar a imprensa, pressionar o Congresso e constranger o STF, com o objetivo de tirá-los do caminho de Bolsonaro. Nunca é demais lembrar que Ramagem e seus auxiliares eram bancados com dinheiro público e controlavam um órgão de inteligência que deveria atuar a serviço do Estado.
Os arapongas não eram muito sofisticados. Às vezes, produziam provas contra si mesmos. A PF encontrou a gravação de uma reunião em que o presidente discute com auxiliares uma estratégia para blindar Flávio Bolsonaro nas investigações da “rachadinha”. O áudio, possivelmente registrado pelo próprio Ramagem, será usado no inquérito.
A investigação sugere também que os servidores alimentavam uma rede de informações falsas que interessavam a Bolsonaro. Eles abasteciam perfis que tentavam desestimular a vacinação contra a Covid e atacavam parlamentares responsáveis pela CPI que apurava a conduta do presidente na pandemia.
O guichê clandestino também trabalhou na tentativa de detonar as urnas eletrônicas para forçar a anulação das eleições e manter Bolsonaro no poder. Depois da derrota, segundo a PF, os arapongas ainda estimularam o fechamento de rodovias, como faísca para um golpe militar.
Na ficha dos espiões, só faltou dar uma força no caso das joias.
Bruno Boghossian, jornalista