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Moro encolhe, e a Lava Jato reage atirando em Serra

A política brasileira virou uma espécie de guerra de facções, sem regras nem limites, onde todos atacam a todos.

As normas institucionais começaram a ruir em 2014, quando Aécio Neves recebeu a desapontadora notícia de que não poderia ocupar a presidência - que imaginava ser dele, por direito divino.

Os tucanos, a chamada elite liberal, os empresários e o mundo jurídico viram que no voto não adiantava insistir. Resolveram, então, usar a Justiça para impedir que o PT seguisse à frente do governo. Os erros na economia e na gestão política, em 2015, ajudaram sim a abrir caminho para o golpe. Mas sem Moro, nada seria possível.

A Lava-Jato foi uma operação de desmonte das regras – com grampos ilegais da presidenta Dilma (“peço escusas”), com arrombamento do sigilo telefônico de advogados de Lula (“foi sem querer”), com conduções coercitivas arbitrárias, com delações forçadas e com um arranjo picareta entre juiz e procuradores que, anos depois, seria comprovado pelas mensagens reveladas por The Intercept no escândalo da Vaza-Jato.

O STF não fez nada para deter os abusos. Porque o alvo era o PT. Por isso, costumo dizer: se Moro é o pai da Lava-Jato, Barroso e outros ministros do Supremo são as mães. E a Globo foi a madrinha.

Moro foi autorizado a fazer o serviço sujo. Valia tudo, romper qualquer regra, pra tirar Dilma, prender Lula e liquidar o PT. Os ignorantes liberais acharam que a balbúrdia jurídica seria usada pontualmente, desconhecendo que o grave abalo no edifício democrático ameaça soterrar a todos.

Sempre dissemos, nos blogs e sites progressistas, que havia uma parceria da Lava-Jato com a turma de Washington. “Ah, não, isso é teoria da conspiração”. 

Simultaneamente à implosão das regras judiciais e democráticas, a Lava-Jato desmontou os setores que incomodavam os EUA: Petrobrás/Pré-Sal e construção pesada. Eram as ferramentas econômicas para o soft power brasileiro mundo afora, nos anos de Lula/Celso Amorim

Todo país que se preza combate a corrupção. Nenhum país que se preza aceita destruir suas empresas para combater a corrupção. A não ser que o processo seja controlado por interesses externos.

Hoje, sabemos a verdade: o FBI era informado de tudo pelos meninos de Curitiba. Ou será o contrário? O FBI fornecia investigações prontas, que depois eram “legalizadas” pelos rapazes de Deltan?

As informações foram bloqueadas por anos e anos. Moro, tratado como herói pela mídia, prendeu Lula e voltou de férias correndo para impedir o habeas corpus que poderia ter soltado o líder petista ainda em 2018.

Atropelos, tropelias, tropeços e trapaças judiciais: agora, tudo vem à tona

Deltan, o procurador das bochechas rosadas, será julgado no Conselho do Ministerio Público, pelo escândalo do powerpoint. A suspeição de Moro (chamado de “juiz ladrão” pelo deputado Glauber Braga) será julgada no STF em breve.

A Lava-Jato, nas cordas, resolve então reagir, e parte para cima de José Serra (PSDB-SP), um cadáver político. É uma forma de dizer: “nós perseguimos o PT? Imagine... Mandamos a PF até na casa do Serra”. Com cinco, sete ou dez anos de atraso? Ok.

Boa parte do que a Lava-Jato agora imputa a Serra já estava no livro “A Privataria Tucana”, de Amaury Ribeiro Jr. O livro foi proibido na velha mídia. Lembram disso? Só os blogs progressistas deram vazão ao livro em 2012, 2013.

Moro e seus aliados tentam tirar coelhos da cartola. Serra, repetimos, é um coelho moribundo; ainda assim, é um coelho. Mas a margem se estreita para o lavajatismo turbinado pela Globo.

Chamo atenção para a pesquisa Atlas desta semana - https://www.atlasintel.org/poll/brazil-national-2020-07-01. Moro, que era o homem mais popular do país, se aproxima rapidamente da mesma taxa de aprovação (30%) e reprovação (60%) onde já estão Lula e Bolsonaro.

Enquanto era parceiro (alguns preferem dizer que era “comparsa”) de Bolsonaro, o ex-juiz tinha 60% de aprovação popular. Ao lado dele, estavam o bolsonarismo e o lavajatismo. Agora, Moro que já apanhava da esquerda passou a apanhar também da extrema-direita.

A desidratação de Moro e da Lava-Jato é visível. O escudo da Globo ainda impede o desmoronamento completo. Mas a tendência é Moro se transformar no líder da facção “liberal” que tenta construir o “caminho do meio” entre Bolsonaro e a esquerda. O país ficaria assim dividido em 3 grandes blocos: Bolsonaro, Lula e Moro.

Nesse arranjo, Moro leva vantagem se enfrentar a esquerda lulista: o bolsonarismo tende a lhe dar apoio eventual contra o petismo.

Da mesma forma, Moro tenderia a receber parte dos votos lulistas (aqueles menos ideológicos), se enfrentasse Bolsonaro num hipotético segundo turno.

Por isso, tanto a extrema-direita como o lulismo/centro-esquerda gostariam de ver Moro desidratado – mais e mais.

O ex-juiz terá que sobreviver ao pedido de suspeição no STF, no segundo semestre de 2020. Terá que sobreviver aos ataques manhosos de Bolsonaro, via Augusto Aras/PGR. E terá que se explicar diante da ira mais que santa de Lula contra a Lava-Jato.

Depois disso tudo, restará a Moro ainda sobreviver a Dória e Ciro - que também sonham em ocupar o papel de líderes do “caminho do meio”.

Manter o espetáculo policial, com apoio da mídia, é fundamental para que o Partido da Lava-Jato alimente o discurso da antipolítica, da sujeira a tomar conta de tudo. Por isso, à esquerda e à direita, não convém comemorar o infortúnio tardio de Serra.

Não que Serra seja inocente. Não é. Longe disso, como atestam os 40 milhões bloqueados na Suiça.

Mas quando a polícia bate à porta do velho senador tucano, não é a Justiça que avança.

É o projeto lavajatista que mostra os dentes, tentando destruir o que resta do mundo partidário, para deixar caminho livre ao falso herói das camisas negras.

Moro vê sua popularidade diminuir. Mas, se retiver um terço de apoio popular, e seguir apostando na antipolítica, pode ainda ser um nome forte pra 2022 – num grande acordo nacional, com a Globo, com os bancos, com o FBI. Com tudo.


Rodrigo Vianna, Jornalista desde 1990.

Fonte: https://www.brasil247.com