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Major Rocha tem muito o que aprender com os cães 

Uma história antiga - que está muito mais para uma fábula digna de Jean La Fontaine, escritor francês imortalizado como o maior contador do gênero -, conta que determinado Rei mantinha uma matilha de cães selvagens, para torturar qualquer de seus servos que cometesse um erro. Um erro, qualquer um, seria fatal: o servo ia direto para o calabouço e virava alimento para os cães.

Um dia, um dos servos, ao cumprir uma tarefa, tomou decisões que não eram do agrado do Rei, o qual, muito irritado, ordenou que o empregado fosse atirado aos cachorros.

Mas o servo fez um último pedido: um prazo de pelo menos mais dez dias de vida. O Rei, a contragosto, acabou concedendo o prazo solicitado pelo servo. Nesses dez dias, o criado foi até o guarda que cuidava dos cães e disse que gostaria de servi-los pelos dias seguintes, que eram os que lhe restavam de vida.

O guarda ficou um pouco desconcertado, mas como favor ao condenado, concordou. Assim, o criado dedicou-se a alimentar os animais, limpá-los, banhá-los e dar a eles todo tipo de conforto, dia após dia.

Quando os dez dias terminaram, o Rei ordenou que o criado fosse jogado aos cães para receber sua punição. Quando o homem foi lançado aos animais pelos carrascos, todos ficaram surpresos ao ver que os tão temíveis cães, conhecidos pela fúria e voracidade, limitavam-se apenas a lamber os pés do servo, balançando o rabo sem nenhuma intenção de atacá-lo.

O Rei, perplexo com o que estava vendo, disse: “O que aconteceu com meus cachorros?”

O servo respondeu: “Majestade, eu servi os cães por apenas dez dias e eles não esqueceram os meus serviços. Infelizmente, eu o servi fielmente por dez anos, mas o senhor se esqueceu de tudo, condenando-me duramente na primeira insatisfação que teve comigo! Quão mais nobres são os cães do que um rei?!”

O Rei, envergonhado, ordenou que o servo fosse libertado, o promoveu-o como um dos sábios conselheiros da Corte, e determinou que os cães fossem entregues aos seus cuidados, para que nunca mais atacassem ninguém.

A fábula me vem à lembrança ao ver, na TV, nas redes sociais e em outros espaços, entrevistas e comentários do vice-governador Wherles Rocha contra o governador Gladson Cameli. O vice usa a crise financeira causada ela pandemia do coronavirus - a pior crise sanitária da história da humanidade -, para promover ataques ao governador, ao governo e a seus aliados, tudo para apunhalar o governador pelas costas. Na ânsia de mais poder e de vir a ser governador titular, vale tudo nesta ótica traiçoeira do vice. 

O caso de possíveis irregularidades na Secretaria de Educação na aquisição de computadores é um bom exemplo do que se diz. A partir de denúncias do próprio Major Rocha, a Polícia Civil passou a investigar irregularidades e até já indiciou pessoas, incluindo o secretário adjunto. 

O fato é que, se houve mesmo irregularidades envolvendo a compra dos computadores, o governador vem agindo no caso como um autêntico magistrado – deu total poder à Polícia Civil para agir e apurar o caso até as últimas consequências. Aliás, em mais de dois anos de Governo, ninguém de boa-fé e consciência pode afirmar que Gladson Cameli tenha cometido irregularidades em seu Governo, embora haja problemas pontuais, como ocorre em qualquer administração pública. Ao que tudo indica, onde há dinheiro público envolvido, há sempre oportunistas de plantão em busca de um quinhão. Mas o governador tem dado demonstrações de que quer fazer um governo limpo, trazendo os órgãos de controle para dentro da administração e não passa a mão na cabeça de possíveis culpados por irregularidades.

Por tudo isso, não seria necessária a pirotecnia da Polícia Civil na hora de prender ou indiciar possíveis envolvidos. Isso ocorre porque, dentro do sistema de segurança pública do Acre, ainda há braços do vice-governador, que foi Major da Polícia Militar e até recentemente o homem forte da área de segurança pública do atual Governo. Tais braços no setor de segurança, visando agradar ao vice-governador, fazem toda piroretecnia envolvendo aliados do governador a fim de atingir o chefe do Executivo.

É claro que nem seria necessário dizer, que ao invés de apunhalar o governador pelas costas, Rocha deveria ajuda-lo a governar. Seria muito interessante se, de fato, houvesse a parceria de ambos, com Rocha ajudando a governar o Estado, enquanto Gladson Cameli ficaria encarregado de fazer a correria em busca de vacinas e recursos para combater a pandemia entre os acreanos.

Pessoas próximas ao governador, a quem ele costuma fazer confidências dos bastidores da política, já revelaram que lá em 2018, no ato da composição da chapa que saiu vencedora no pleito, o vice-governador dos sonhos de Gladson Cameli, antes de oficializar sua candidatura, era o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE), Walmir Ribeiro. A ideia de Gladson era trazer o TCE para dentro da administração e agradar ao MDB, partido ao qual Walmir Ribeiro sempre foi aliado, além de ter a seu lado uma pessoa cujo passado e presente são exemplos de um homem público probo e honrado.

No entanto, o então deputado federal Wherles Rocha praticamente atirou-se aos pés de Gladson Cameli implorando a oportunidade de ser seu vice, sob uma série de promessas de ajudá-lo a governar o Estado, principalmente na área de segurança pública. Coração maior que suas ambições políticas, Gladon Cameli cedeu o espaço para fazer de Rocha seu vice e agora, como pagamento a tudo que fez para torná-lo o que é, ajudando inclusive a eleger sua irmã Mara Rocha como deputada federal, Cameli se vê às voltas com o mesmo problema enfrentado pelo falecido governador Edmundo Pinto em relação ao vice Romildo Magalhães, o que deixa familiares e amigos de Gladson muito preocupados. 

O que se espera é que o atual governador tenha mais sorte que Edmundo Pinto, assassinado, de forma misteriosa, num quarto de hotel, em São Paulo. Tais preocupações têm razão de ser porque as mesmas ações que precederam à morte de Edmundo Pinto estão sendo colocadas em práticas agora em relação à Gladson Cameli. Quem vivia no Acre daqueles tempos sabe que, antes de ser morto, Edmundo Pinto vivia sob uma saraivada de críticas e denúncias, todas elas patrocinadas pelo então vice-governador e membros de seu grupo, a fim de transformar o governador, antes de seu assassinato, num cadáver político. 

Concluo dizendo que, bem ao contrário dos cachorros da fábula com cuja história iniciei o presente artigo, Major Rocha não sabe o que é lealdade nem gratidão. Pelo comportamento de ingratidão e de traidor, para ser um político honrado e um cidadão de bem, Rocha tem muito o que aprender com os cachorros.


Tião Maia, jornalista