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Lula pode fechar a conta

Lula pode fechar a conta

A pesquisa do Ipec mostrou uma leve oscilação dos entrevistados a favor da possibilidade de Lula liquidar a eleição no domingo. Coisa leve, mas esparramada: o petista subiu um ponto, dentro da margem de erro, e a rejeição a Bolsonaro também cresceu um ponto, para 51%. Sempre dentro da margem de erro.

Pelo andar da carruagem, o debate de amanhã na TV Globo, bem como a divulgação dos números do Datafolha, trará fortes emoções. Enquanto os candidatos pouco podem fazer para mudar os números de uma pesquisa, um debate é coisa que depende deles.

Lula teve um desempenho bisonho no debate da TV Bandeirantes e decidiu não ir ao do SBT. Em nenhum dos dois Jair Bolsonaro teve bom desempenho, e é sempre bom lembrar que ele se elegeu em 2018 faltando a todos os debates.

Amanhã, o debate da Globo terá a mesma característica dos demais: os candidatos são dois (Lula e Bolsonaro), e os demais poderão se julgar vencedores se conseguirem jogar a decisão para o segundo turno. Ciro Gomes e Simone Tebet estarão lá por direito de conquista. Já o pitoresco Padre Kelmon irá ao ar levado por uma excentricidade da legislação. Formalmente, ele é sacerdote da Igreja Ortodoxa do Peru. Na vida real, substitui o deputado Roberto Jefferson, considerado inelegível pela Justiça.

Se fosse possível filtrar o debate, fixando-se no desempenho de Bolsonaro e Lula, as coisas ficariam melhores, mas só até certo ponto. Isso porque Bolsonaro já mostrou que é ruim de debate, e Lula, bom de palanque, é imprevisível nesse tipo de confronto. Falta a ambos, nos debates como na vida real, a serenidade de Fernando Henrique Cardoso.

Dois meses de campanha mostraram que as balas de prata de Bolsonaro eram de vidro e se quebraram. Em 2018 ele prevaleceu cavalgando as crises dos governos anteriores. Agora, o capitão cavalga o pangaré de sua administração. Como bem lembrou Eliane Cantanhêde, o general da reserva Augusto Heleno escreveu um artigo pedindo aos eleitores que não votem em Lula. Ok, diria o capitão, mas, em cerca de 4 mil palavras, o general não se referiu ao governo a que serve desde 2019. Nem uma palavra. O artigo ecoa a retórica de Fernando Collor na eleição de 1989. Deu no que deu.

O conservadorismo brasileiro recolocou Lula na porta do palácio porque atou-se ao atraso de forma inédita no período republicano. Mesmo no Império, só na década de 1840 o regresso misturou-se ao estímulo ao contrabando de negros d’África. (Qualquer semelhança com os desmatamentos ilegais e as milícias amazônicas é mais que coincidência. A História não se repete, mas rima, ensinou Mark Twain.)

Em 2018, o general fustigava os políticos do Centrão. Em 2022, convive com parte dele (a outra parte está calada ou já aderiu a Lula). Justificando-se, disse que “a evolução de opinião faz parte da vida do ser humano”.

São muitos os conservadores que, diante do dilema Lula x Bolsonaro, ficaram com o ex-presidente. De esperança em 2018 com seu pitoresco Posto Ipiranga, Bolsonaro tornou-se pesadelo para boa parte dos conservadores em 2022.

Foi a qualidade da administração de Bolsonaro que levou o ex-ministro Joaquim Barbosa, o ferrabrás do mensalão, a gravar uma mensagem de apoio a Lula.


Elio Gaspari, jornalista

Fonte: https://oglobo.globo.com