Não sei se as revelações do tenente-coronel Mauro Cid sobre movimentações golpistas na alta cúpula militar são verdadeiras nem se ele tem meios de provar o que conta, mas, pelas reações dos envolvidos, há aí uma história a ser esclarecida.
O que já dá para dizer é que os generais não deveriam esperar medalhas por não ter embarcado num golpe. Não fizeram mais do que a obrigação —e talvez menos. Há uma polêmica em relação a se eles tinham o dever legal de denunciar a trama logo que dela tiveram conhecimento. Alguns juristas pensam que sim, outros sustentam que a condição de subordinados os desobrigava de levar as maquinações do chefe a público. Em relação ao dever ético, contudo, não há controvérsia. A denúncia era um imperativo moral. A lealdade última dos comandantes militares é para com a Constituição e o país, não para com inquilinos passageiros do Alvorada.
Mesmo que, num gesto de magnanimidade, estejamos dispostos a concluir que generais e brigadeiros, mas não almirantes, agiram corretamente no caso da consulta golpista, há outros episódios em que a cúpula castrense errou, alimentando os apetites extrainstitucionais de Bolsonaro. Um momento crucial foi quando o Exército decidiu não punir o general Pazuello, que rasgara o regulamento ao participar de ato de campanha do então presidente. Ali, Bolsonaro ficou achando que seus pedidos eram ordens.
Outro grande equívoco foi colocar as Forças Armadas como parte ativa da pantomima bolsonarista para desacreditar as urnas eletrônicas. Os militares não apenas se meteram com política, o que lhes é vedado, como também demonstraram baixíssima confiabilidade técnica.
Se nossos generais estão em busca de um modelo, devem olhar para os EUA. Ali, assim que Trump deu sinais de que não aceitaria a transferência de poder, eles foram se distanciando do presidente, no limite da insubordinação. A lealdade é para com a Constituição.
Hélio Schwartsman, jornalista