Semana passada, publiquei artigo comentando a desconfortável semelhança entre Cuba e Brasil no tocante à enorme quantidade de lixo espalhada em espaços públicos, e citei o sucesso de Formosa em controlar o problema. Leitores indagaram: o que fizeram? Muitas ações, impossível detalhá-las neste espaço; cito algumas.
Formosa era conhecida como “ilha do lixo” em 1987, quando dez donas de casa se juntaram para debater, propor soluções e agir para resolver problemas da comunidade. Três décadas após, não há lixo nas ruas, nem latas de lixo, a ilha é recordista em reciclagem e tem uma das menores taxas de geração de lixo per capita no planeta. A literatura atribui àquele grupo de donas de casa a fagulha que iniciou a grande transformação.
Manifestações populares criticavam a ineficiente coleta de resíduos. O poder público propôs um programa de construir incineradores – motivado, talvez, pelo grande capital? –, rejeitado pela população. Aquele pequeno grupo de mulheres mostrou que 40% do lixo era reciclável e 35% poderia virar adubo. Em Cuba, o embargo gera falta de fertilizantes, e pouco ou nada se aproveita do material orgânico lançado ao lixo!
Após analisar várias experiências, Formosa adotou políticas amplas e eficazes. Em 2017, já reciclava 62% dos resíduos municipais e, na capital, a geração se reduzira em 70%!
Fabricantes, importadores e consumidores passaram a pagar, com base num cálculo do real custo de disposição dos dejetos, para financiar a coleta, reciclagem e disposição de resíduos. O lixo a descartar é acondicionado em sacos padronizados, obrigatórios, vendidos a um preço que ajuda a financiar o sistema; maneira simples de aplicar o princípio “quem gera mais paga mais”, além de induzir menor geração de resíduos. Para evitar os “espertos”, que descartavam seu lixo em latas públicas, estas foram eliminadas das ruas.
Desde 2002 há restrições ao uso de sacos plásticos, vedando-se sua distribuição gratuita em número crescente de setores econômicos, inclusive supermercados e padarias.
Caminhões de coleta passam em horários definidos. Quem perde essa chance pode levar seu lixo a locais onde recebe, em troca, bônus para baratear suas passagens no transporte público. Há apps que dizem ao cidadão onde está o coletor ou o caminhão mais próximo. Há ainda um 0800 para orientar e esclarecer dúvidas.
Já na década de 2010 aquela organização da fagulha inicial passou a mostrar os municípios mais e os menos limpos, gerando incentivo para que estes últimos melhorassem! Há anos centenas de empresas de reciclagem estão em operação, com faturamento anual maior que US$ 2 bilhões, indicando que há futuro em políticas preservacionistas!
Deixando Formosa e considerando o planeta, estima-se que as atuais 2 bilhões de toneladas de lixo por ano cheguem a 3,4 bilhões em 2050! Formosa mostra que há caminhos melhores para o futuro. Brasil, Cuba e outros precisam aprender, com urgência!
Eduardo Fernandez Silva. Ex-Diretor da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados
Fonte: https://www.metropoles.com