A relação entre o Palácio do Planalto e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), vai de mal a pior. Mas isso não significa que o Centrão esteja 100% alinhado com ele, apesar de sua liderança sobre o grupo. Embora dê demonstração de força e tenha poder para segurar votações de interesse do governo Lula, o deputado faz movimentos arriscados.
Em primeiro lugar, Lira não pode adiantar o anúncio de quem terá o seu apoio na disputa pelo comando da Câmara, mesmo pressionando o presidente Lula a avalizar desde já esse candidato. A eleição dos novos presidentes da Câmara e do Senado ocorrerá somente em fevereiro de 2025 e qualquer articulação escancarada, nesse momento, pode fazer o seu mandato terminar antes da hora.
Além disso, se o troco no governo respingar na agenda do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, Lira perde o respaldo do mercado e da Faria Lima. Ele sabe dessa “armadilha”.
O discurso oficial para a rebelião é de que o Planalto não cumpre acordos e não libera as verbas acertadas para as emendas orçamentárias. A preocupação com o dinheiro atinge todos os parlamentares neste ano de eleições municipais.
Diante desse cenário, a manifestação de Lira na retomada dos trabalhos legislativos, anteontem, foi sob medida para ecoar no baixo clero, de quem ele precisa para fazer o sucessor.
O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, assegura que o governo reservou, de janeiro a dezembro de 2023, R$ 34,6 bilhões para pagar emendas. Aliados do presidente da Câmara – que pede a cabeça de Padilha – dizem, por sua vez, haver bloqueio de verbas.
O problema é que, se Lira exagerar na dose, racha o Centrão. Motivo: há no grupo vários pré-candidatos à sua vaga, além do líder do União Brasil, Elmar Nascimento (BA), até agora o preferido por ele.
Estão na lista dos que pretendem disputar a cadeira de Lira os deputados Antônio Brito, que comanda a bancada do PSD, e Marcos Pereira (Republicanos), vice-presidente da Câmara. Os dois têm se aproximado cada vez mais do governo. Nos bastidores, dirigentes do PT e auxiliares de Lula afirmam que o favorito do Planalto é Brito.
Para completar, o PSB do vice Geraldo Alckmin deixou o bloco de Lira. Nesse jogo, enquanto a cúpula do PT esfria o café do presidente da Câmara, o governo joga isca para dividir o Centrão.
Só que política não é aritmética e Lira também tem sua “bancada” no PT. Muitos ali se lembram de que uma canetada do presidente da Câmara, à época Eduardo Cunha, alavancou o impeachment de Dilma Rousseff. O Brasil de 2024, porém, não tem semelhança com o de 2016. E, além disso, Lula não é Dilma.
Vera Rosa, jornalista
Fonte: https://www.estadao.com.br/