Os diamantes são eternos. Os almirantes bentos, eternos. Os assessores dos almirantes com coragem para entrar no país com encomenda de Jair Bolsonaro: eternos. (Os assessores com dinheiros nas cuecas, idem; os senadores com dinheiro na cueca.)
Eternos porque, no Brasil, a República ainda não superou o império do contrabando. (Nada a ver, hoje, com o capitão da Liesa.) Daí por que, até o último dia, mobilizando pelo menos três ministérios, o capitão Bolsonaro, presidente, tentou fazer entrar ilegalmente no país o presente milionário da ditadura saudita. Tinha certeza de que conseguiria. Não conseguiu. Terá havido outras vezes? O que haverá passado? Quanto passou?
Passou. Tem passado.
Os diamantes são eternos. Os bentos e suas mulas, eternos. Eternos também os juscelinos, porque eterno o uso do Estado para abrigo de interesses privados. Os diamantes passam.
A ascensão do deputado Juscelino Filho é produto da sociedade, via orçamento secreto, do governo Bolsonaro com o consórcio parlamentar liderado por Arthur Lira. Esse modelo de relacionamento foi premiado por Lula, de quem Juscelino se tornou ministro. Ainda é? E, caindo o filho, já caiu?, qual outro indicado do papai Alcolumbre, essa joia, virá? Cuidado com o trânsito das joias.
Lula venceu Bolsonaro. A democracia venceu. Certo? A vitória da democracia não pode servir para sombrear a República. Como lidar com os apelos das joias?
Os diamantes tentam entrar, na mochila de algum juscelino, porque eterna, entre nós, é a cultura de apropriação patrimonialista do Estado. Diamantes não entram sozinhos. Diamantes têm bentos. O orçamento, senhores. O Estado, donos. Os estados são ainda capitanias hereditárias. Ou haverá outra conclusão ante o que este jornal reportou na edição de ontem? Que, dos atuais 232 conselheiros em tribunais de contas do país, 30% são parentes de políticos.
Qual a contribuição — à infâmia — do primeiro escalão de Lula?
Renan Filho, ministro dos Transportes, conseguiu que a mulher se tornasse — em dezembro de 2022 — conselheira do Tribunal de Contas de Alagoas, estado que governou até abril do ano passado. E o que será isso, senão se servir do poder, da influência, para privatizar espaços de natureza impessoal como os de fiscalização dos usos de dinheiros públicos?
Waldez Góes, ministro do Desenvolvimento Regional, outro afilhado de Alcolumbre na Esplanada, nomeou a mulher para o Tribunal de Contas do Amapá em fevereiro de 22, enquanto ainda governador. (Escrevi sobre Góes e Alcolumbre na semana passada: aqui.)
Suponho que seja desnecessário registrar que integrantes dessas cortes não têm como função ganhar R$ 41.800 vitaliciamente, mas julgar as contas dos chefes dos Executivos. Nepotismo é proibido no serviço público. Os diamantes, porém, passam.
O ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, estrela do petismo, tem a mulher como conselheira do Tribunal de Contas do Piauí desde janeiro de 2023, estado que governou até março de 2022. O que ele diria se Tarcísio de Freitas, ao fim de seu governo em São Paulo, operasse por fazer a mulher conselheira do tribunal de contas estadual? Diria nada. Porque sem moral.
Sem moral também vai o poderoso ministro Rui Costa, da Casa Civil, grão-petista, que ora trabalha para que a mulher seja conselheira do Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia, estado que dirigiu pelos últimos oito anos.
Como é que lida com Juscelino Filho? Com Daniela do Waguinho? Com que autoridade? Mais facilmente compondo com a turma do “deixa-disso”. Donde eternos, os juscelinos. (E os waguinhos.)
A federação de patrimonialismos conhecida como União Brasil saiu em defesa do ministro do Quarto de Milha. Os vendedores de terrenos na Lua (apoio em bloco de partido que não existe) querem que os petistas tratem o rapaz — ou o próximo rapaz — da mesma maneira como aos seus. Os elmares decerto considerando injustiça que Juscelino caia — já caiu? — por tão pouco.
O que será viagem em avião da FAB e umas diárias para visitar equinos e prestigiar a inauguração de praça com nome em homenagem ao cavalo do sócio, o que serão uns orçamentos secretos para asfaltar a estrada que serve à própria fazenda perto da multiplicação de patroas em cargos vitalícios?
A largueza dos costumes oferece um Estado a cada um. Cada um entendendo à própria maneira. Diamantes a todos. Diamantes vitalícios. Juscelino vai. Outro vem. As joias ficam.
Se petista graúdo, ex-governador, ministro, pode ter família eternizada no Estado, na folha do Estado, por que os alcolumbres não poderão ter juscelinos e outros representantes do orçamento secreto no ministério de Lula? Qual o problema em Elmar Nascimento, do União Brasil de Lira, continuar governando a Codevasf?
O União Brasil, bento seja, só quer carinho para com o Juscelino que vier. Só quer os mesmos pesos e medidas na partilha do Estado. Diamantes vitalícios a todos.
Carlos Andreazza, jornalista
Fonte: https://oglobo.globo.com