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Critério para o STF deveria ser independência

Indicar ministro evangélico para o Supremo, com eventual aprovação pelo Senado, é direito do presidente da República. Tal como a indicação do católico ministro Menezes Direito pelo presidente Lula. Agradou muito sua base católica. O critério da religiosidade influencia, sim, decisões políticas. No Brasil do católico ex-presidente Dutra, o jogo de azar foi proibido. Dona Santinha, então primeira-dama, acreditava ser contra nossa tradição religiosa. Vale até hoje. Só com o primeiro presidente não católico, o luterano Ernesto Geisel, que controlava o Congresso, se aprovou o divórcio.

Além do notável saber e reputação ilibada, o critério fundamental para a escolha do candidato deveria ser, por um lado, a independência e imparcialidade no cargo. Por outro, a transparência e o comportamento.

Darcy Ribeiro foi tudo. Ou quase tudo na vida cultural e política de nosso País. Foi criador e reitor da Universidade de Brasília, ministro da Educação e da Casa Civil, senador, membro da Academia Brasileira de Letras. Mesmo assim, dizia que nunca ambicionou cargo algum. Não ia aos cargos. Os cargos chegavam a ele. Parodiando Picasso, ele não os procurava. Era achado.

Ambicionar um cargo hoje, dizia Darcy, é perder a independência de amanhã. Bolsonaro governa gerindo a ambição dos atuais e futuros colaboradores.

Alguns sugerem que André Mendonça foi contaminado pela ambição do cargo. No que o Supremo tem de mais precioso: a imparcialidade futura. Enquanto ministro da Justiça agiu inusitadamente pró-Bolsonaro. Determinou dossiê secreto contra servidores antifascistas. Assinou de surpresa habeas corpus a favor do ex-ministro Weintraub, que hoje ganha um supersalário no Banco Mundial por indicação do presidente da República.

Existiriam dois André Mendonça? Um antes da ambição. Quase unanimidade favorável entre membros do próprio Supremo. Discreto, autônomo, preparado. Outro depois da ambição? Partidário e político? “Servo do profeta”, como já disse? Qual prevalecerá se nomeado para o Supremo? Quando o presidente afirma que sua indicação é terrivelmente evangélica, faz pressão por antecipação.

Já pede voto “terrivelmente” em favor de causa evangélicas. Se for como o católico ex-ministro Célio Borja, desligaria o telefone na cara.

A questão não é a disputa entre o presidente, com minoria no Senado, e o Centrão, com maioria. A questão para a democracia é maior. O ditado popular diz que não se pode prever o que sai da cabeça de um juiz. É verdade. Mas do seu temperamento, caráter, e conduta sim. Pode se prever e cobrar. Esperar para ver.


Joaquim Falcão é professor de Direito Constitucional e membro da Academia Brasileira de Letras. Artigo transcrito do jornal O Estado de S. Paulo

Fonte: https://www.metropoles.com