A inelegibilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro é um fato marcante da nossa história política recente, uma história que conta com várias crises, impeachments, tentativas de golpe, ou golpe propriamente dito.
Os argumentos dos ministros Raul Araújo e Kassio Nunes Marques a favor do ex-presidente no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) refletem uma atitude leniente em relação ao seu comportamento político nos últimos 35 anos que, se prevalecesse agora, permitiria que Bolsonaro continuasse sua carreira destruidora, que deveria ter sido interrompida há muito tempo.
Assim como passou 30 anos como vereador, deputado estadual e deputado federal cometendo barbaridades sem que fosse punido porque era considerado um membro desimportante do baixo clero, agora seria absolvido pelo TSE porque seus crimes não deram certo: o golpe fracassou, a TV Brasil não tem audiência, sua opinião pessoal quanto às urnas foi derrotada no Congresso.
O fato de ter cometido crime de abuso do poder político sendo presidente da República seria o de menos para seus defensores, como se Bolsonaro fosse apenas mais um qualquer entre muitos aloprados inconsequentes espalhados por aí.
Quando Bolsonaro diz que é ridículo dizer que um bando de “senhorinhas e senhorinhos” queriam dar um golpe no dia 8 de janeiro, ele tenta minimizar a rebelião que incentivou durante todo o seu governo. O fato de não ter dado certo não o livra da culpa de ter alimentado a rebelião que depredou os prédios públicos de Brasília. Invadir o Supremo, o Congresso, o Palácio do Planalto não acontece do nada, é preciso fomentar essa raiva contra as instituições para obter o resultado infame.
Se nada mais aconteceu, é porque a cúpula das Forças Armadas nunca aderiu aos chamados de Bolsonaro, embora oficiais de alta patente estivessem envolvidos na tentativa de golpe. Uma condenação como essa, rigorosa como necessário, é fundamental para que o estado democrático seja cada vez menos relativizado entre nós.
Merval Pereira, jornalista