Na política, uma imagem, ou um gesto, valem mais do que mil palavras. Por isso, um atento observador da cena política alertou a coluna de que o ingresso do Progressistas (PP) e do Republicanos no primeiro escalão do governo Lula 3, de modo a assegurar a governabilidade na Câmara dos Deputados, estava selado desde o dia 7 de julho, quando foi aprovada a reforma tributária.
Para chegar a essa conclusão, bastava olhar com atenção a fotografia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de sorriso largo, tendo à volta o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e os líderes partidários, registrada na tarde daquela sexta-feira.
Naquele dia, Lula havia recebido o grupo no Palácio da Alvorada para agradecer a aprovação da reforma tributária e do projeto que favorece o governo no caso de empates em julgamentos no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf).
Ainda falta concluir a votação do novo arcabouço fiscal. Mesmo assim, a imagem de Lula junto com a cúpula da Câmara naquele dia foi, até agora, a sinalização mais clara de um entendimento entre o governo e a Casa legislativa desde o início do ano, e após muita turbulência. Quem não se lembra de que a reestruturação ministerial quase foi para as calendas, sob a articulação de um irascível Arthur Lira?
Passados 18 dias daquela fotografia, as indicações dos deputados Sílvio Costa Filho (Republicanos-PE) e André Fufuca (PP-MA) para o ministério de Lula estão consolidadas.
Com o retorno do presidente da viagem a Bruxelas, a expectativa é de que as conversas dele com Lira e com lideranças do Republicanos e do PP para definição dos respectivos espaços das siglas, e dele com os ministeriáveis, ocorram nesta semana.
Pelo cronograma dos articuladores de Lula, os novos ministros tomariam posse na primeira semana de agosto - mais tardar no dia 7. Isso porque nos dias 8 e 9, Lula estará em Belém (PA), participando da Cúpula dos Países Amazônicos. Em seguida, no dia 15, ele embarcará para Assunção, onde prestigiará a posse do novo presidente do Paraguai, Santiago Peña.
É desejo dos articuladores do governo e das lideranças do Centrão que a reforma ministerial seja concluída até o dia 7 para que a frenética agenda internacional de Lula não tumultue esse desfecho.
Há compromissos previstos para todo o mês de agosto. Depois da viagem ao Paraguai, Lula embarcará no dia 20 ou 21 para Johanesburgo, onde participará da cúpula do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Para arrematar, no dia 27, ele deve comparecer à reunião da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) em São Tomé e Príncipe.
Mas o desejável prazo de 7 de agosto é dos articuladores do governo e do Centrão, não é de Lula. “Ninguém pauta o presidente”, lembrou uma fonte a par das discussões. Todos estão dançando a mesma música, mas o maestro é Lula.
O esboço mais recente das mudanças no primeiro escalão submetido ao presidente contemplava o Republicanos no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic), pasta que já foi ocupada pelo partido na gestão de Michel Temer.
A se confirmar esse arranjo, Lula quer garantir um papel de protagonismo ao vice-presidente Geraldo Alckmin, que está à frente do Mdic. Segundo fontes a par dessas articulações, Alckmin passaria a ter uma atuação “transversal” no governo, com missões em várias frentes: por exemplo, ganharia função de destaque na execução do novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Outra proposta submetida ao crivo de Lula é entregar o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) ao PP, porém, sem o programa Bolsa Família, principal vitrine eleitoral do PT. O programa seria remanejado para outra pasta: cogita-se o Ministério da Fazenda, o que daria mais fôlego ao nome do ministro Fernando Haddad para a sucessão em 2026, caso Lula não dispute a reeleição, e a economia esteja forte.
Outra alternativa em estudo é de que o Bolsa Família vá para o guarda-chuva do Ministério das Mulheres porque a maioria expressiva dos beneficiários são mulheres chefes de famílias. A se confirmar esse desenho, a ministra Luciana Santos, titular da pasta de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) seria remanejada para a pasta das Mulheres para cuidar do Bolsa Família, e a ministra Cida Gonçalves, perderia lugar no primeiro escalão.
Wellington Dias (PT-PI), titular do MDS, senador licenciado, e aliado de décadas de Lula, assumiria o comando da Ciência e Tecnologia para abrir espaço ao Centrão. Seria o “PT cortando na própria carne”.
Nos bastidores, Lula ficou satisfeito com as indicações partidárias, em especial com o indicado do Republicanos. Ex-líder da bancada e relator do projeto de autonomia do Banco Central, o deputado Silvio Costa Filho - a quem Lula chama de “Silvinho” - é filho do ex-deputado Silvio Costa, um dos aliados mais caros a Lula.
Quem orbita de perto o entorno de Lula sabe que o presidente reconhece quem se manteve do lado dele na adversidade. (E recorda-se bem de quem o abandonou).
Silvio Costa foi um dos mais combativos defensores de Dilma Rousseff durante o impeachment, e visitou Lula na prisão em Curitiba. Em declaração que soa como música para o petista, comparou-o a Nelson Mandela.
Andrea Jubé, jornalista
Fonte: https://valor.globo.com/