Era bola cantada desde o início deste ano, e aqui foi cantada: ou o governo gasta o que tem e o que não tem para reeleger o presidente Jair Bolsonaro, ou a derrota é certa. Foi o próprio Bolsonaro quem concluiu isso depois de dar-se conta das dificuldades e dar ouvidos às principais feras do Centrão, todas famintas por verbas.
Paulo Guedes, ministro da Economia, um dia apontado como o Posto Ipiranga do governo, resistiu o quanto pôde, mas se rendeu. Ora, ele mesmo não disse na célebre reunião ministerial gravada que resultou na queda do ministro Sergio Moro que o governo deveria fazer a opção preferencial pela reeleição?
Então, abriu-se a porteira, e a boiada começou a passar. O teto de gastos está prestes a desabar, e o calote no pagamento de dívidas judiciais vencidas (precatórios), coisa julgada pelo Supremo Tribunal Federal, foi aprovado pela Câmara. Agora, cabe ao Senado dizer sim, em parte é certo que dirá. Mas isso só não basta.
Falta espaço no Orçamento de 2022 para que o governo aumente o salário dos servidores públicos, de todos, como promete Bolsonaro, mas Guedes está aí para o quê? Vire-se! Corte despesas. Faça mágica. Não importa que a inflação dispare e que o Banco Central suba os juros para contê-la. Importa, ele bem sabe o quê…
De Lisboa, onde se encontrava ontem, Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, que há meses só se queixa de Bolsonaro atrapalhar seu trabalho, advertiu de maneira mais direta, impossível:
“O índice de inflação acelerou e teve piora quantitativa e qualitativa. É muito importante ser realista e entender o quanto ela está disseminada e o quanto difícil será o trabalho do Banco Central nesse ponto”.
O relator-geral do Orçamento, deputado Hugo Leal (PSD-RJ), chocou-se com a decisão de Bolsonaro que beneficiará os servidores:
“Não sei de onde ele tirou isso. Não está no nosso cálculo. Particularmente, em nenhum momento foi trabalhado isso”.
De manhã, em Bahrein, no Golfo Pérsico, Bolsonaro havia dito:
“A inflação chegou a dois dígitos, então conversei com Paulo Guedes. Em passando a PEC dos Precatórios, tem que ter um pequeno espaço para dar algum reajuste. Não é o que eles merecem, mas é o que nós podemos dar”.
À tarde, em Brasília, o ministro da Cidadania, João Roma, respondeu que reajustar o salário de servidores “não está no elenco” de ações pretendidas pelo governo a partir do espaço fiscal de R$ 91,6 bilhões que será aberto com a PEC dos Precatórios. E daí? Não tem vida longa ministro que contraria Bolsonaro.
Em condições normais de temperatura e pressão, Bolsonaro não será reeleito. Dono da caneta mais carregada de tinta da República, ele está empenhado em comprar a reeleição.
Ricardo Noblat, jornalista
Fonte: https://www.metropoles.com