Quinze de Novembro de 2021, data dos 132 anos da Proclamação da República no Brasil: o ocupante do Palácio do Planalto, Jair Bolsonaro, com a família e o seu ministro da Economia, Paulo Guedes, estava no Oriente Médio, hospedado nos Emirados Árabes em um dos hotéis mais caros e luxuosos do planeta, em viagem oficial. Flutuava no paraíso de miragens vendendo sonhos e inverdades sobre a economia brasileira e a Amazônia, ou aproveitando o tempo de ociosidade para alimentar falsa polêmica com o dono do PL, o notório Valdemar da Costa Neto, sobre seu ingresso no partido do Centrão, para disputar a reeleição. Nada, uma palavra sequer, do chefe da nação, sobre o dia da República no Brasil.
Na mesma data, o ex-presidente Lula também estava fora do País: em tour europeu, levando a tiracolo seu escudeiro para questões internacionais, Celso Amorim, chanceler de seu governo. Em Bruxelas, na Bélgica, no Parlamento Europeu, participou de uma conferência “para líderes de esquerda da América Latina”, promovida pelo bloco social democrata. O líder nas pesquisas para as eleições de 2022, no encontro de velhos e novos esquerdistas, discursou e deu entrevistas. Aproveitou a pergunta de uma jornalista para mandar recado ao PT e a adversários, sobre a chapa “das esquerdas”, e destacou a possibilidade de ter o ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), como vice. Teceu loas ao tucano e afirmou: “nada há de acontecido entre nós dois que não possa ser reconciliado”. Nenhuma palavra ou aceno – igual ao adversário “da direita”- sobre a data republicana brasileira.
Simbólica coincidência do tempo temerário que atravessamos – a Europa outra vez no epicentro da pandemia Covid-19 a sinalizar advertência ao “País do Carnaval” já em ritmo de prévias para o Momo 2022 que, – além da República – atacada de muitos lados por inimigos às claras ou nas sombras (de Brasília a Lisboa), de que a pandemia ainda está viva, depois das quase 615 mil mortes que já causou no País. Mal comparando (ou bem?), o dia da República, este ano, passou praticamente ao léu. Salvo por menções sobre a data postadas nas redes sociais pelo ex-juiz, Sérgio Moro, presidenciável da 3ª Via; e o ex-procurador federal, Deltan Dalagnol – que vai ingressar no Podemos, mês que vem – em “Live” sobre “as causas da corrupção.
Estes fatos me fizeram recordar da antológica crônica “15 de Novembro”, de Lima Barreto, publicado no 32º aniversário da Proclamação da República, quando da morte da princesa Isabel. “Vi em tudo isso a República; e não sei por quê, mas vi. Não será, pensei de mim para mim, que a República é o regime da fachada, da ostentação, do falso brilho e luxo, do futuro repousado na miséria geral? Não posso provar e não seria capaz de fazê-lo. Saí pelas ruas do meu subúrbio (do Rio) longínquo a ler as folhas diárias. Lia-as, conforme o gosto antigo e roceiro, numa “venda” de que minha família é freguesa. Quase todas elas estavam cheias de artigos e tópicos, tratando das candidaturas presidenciais. Afora o capítulo descomposturas, o mais importante era o de falsidade. Não se discutia uma questão econômica ou política; mas um título do Código Penal. Pois é possível que, para a escolha do Chefe de uma Nação, o mais importante objeto de discussão seja esse?”, pergunta Lima Barreto em seu texto tão ardente e pulsante quanto atual. Responda quem souber: de antes e de agora.
Vitor Hugo Soares é jornalista, editor do site blog Bahia em Pauta
Fonte: https://www.metropoles.com/