O Congresso Nacional inicia esta semana, na Câmara dos Deputados, a discussão e votação do novo arcabouço fiscal que substituirá o Teto dos Gastos, que aprovamos em dezembro de 2016. Depois seguirá para apreciação do Senado Federal. Será uma medida essencial para definir os rumos da economia brasileira. Hoje, o “Calcanhar de Aquiles” para a retomada do crescimento econômico, gerando renda e emprego para a população brasileira, reside no plano fiscal, já que no âmbito das políticas monetárias e cambial estamos bem resolvidos com o sistema de metas inflacionárias, a autonomia do Banco Central e o câmbio flutuante.
A dinâmica da economia é dada no mundo das relações privadas, no mercado, aonde se encontram investidores, produtores, contribuintes e consumidores. Mas o governo, através da política econômica, tem grande poder e influência, impactando decisões e comportamentos dos diversos agentes econômicos.
O equilíbrio das contas públicas não é um objetivo em si. Não é um tema popular. No entanto, o desequilíbrio fiscal resulta em inflação, juros altos, e, portanto, na queda do ritmo de crescimento da economia. A desorganização do orçamento público, no limite, em situações radicais, ao provocar inflação alta e recessão, sacrifica a economia como um todo, mas particularmente os brasileiros mais pobres, diminuindo seu poder de compra e dificultando o acesso ao emprego.
Nossa situação é delicada porque ainda somos uma economia emergente com uma dívida alta para os padrões deste grupo de países. Quanto maior a dívida, quando pior for sua trajetória projetada para o futuro, mais se deterioram as expectativas daqueles investidores que financiam os sucessivos déficits governamentais, diante da perspectiva que pode crescer de insustentabilidade, inadimplência, moratórias, congelamentos de ativos, etc.
Muitos colegas economistas concentram suas atenções e recomendações no corte de gastos. Têm razão que é preciso melhorar a qualidade do gasto público, coibir aumento da carga tributária e cortar despesas para reequilibrar o orçamento. Mas, o nosso atual estrangulamento fiscal é fruto de um processo histórico resultante das opções políticas feitas desde a Constituinte de 1988. Hoje, o orçamento é rígido, com as despesas obrigatórias ocupando mais de 90% do orçamento da União. A margem para gastos discricionários (investimentos e gastos sociais estruturantes) é mínima. Apenas as despesas com folha de salários e previdência consomem mais de 80% das receitas disponíveis. Para agir sobre essa realidade somente com uma nova rodada de reforma da previdência e uma profunda reforma administrativa. Estas reformas não constam da agenda escolhida pelo Governo Federal e o Congresso Nacional até 2026.
O ajuste fiscal deve ser multilateral, racionalizando gastos, promovendo reformas estruturais, melhorando a eficiência da arrecadação, contando com receitas extraordinárias oriundas de privatizações e parcerias, reduzindo incentivos e renúncias fiscais injustificáveis, somando os efeitos do crescimento econômico.
O relator do PL do Arcabouço Fiscal, deputado Claudio Cajado (PP/BA), realizou excelente trabalho ancorado na excelente assessoria técnica da Câmara dos Deputados e no diálogo com o Ministério da Fazenda, economistas independentes e representantes da sociedade e do mercado. Introduziu importantes avanços e aprimoramentos em relação ao texto original enviado pelo Executivo.
Como chamou atenção o economista e ex-diretor executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), Felipe Salto, em nota técnica da corretora Warren Rena, o substitutivo apresentado pelo relator introduz mecanismos de ajuste automático em caso de rompimento das metas de resultado primário, aprimorou o uso do IPCA como parâmetro, prevê a explicitação da projeção da trajetória da dívida pública bruta e sua compatibilidade com as metas de resultados fiscais, manteve os dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal sobre as infrações e responsabilidades do gestor mantendo a necessidade de contingenciamento de despesas automático em caso do não atingimento das metas fiscais, diminui as exclusões de despesas não incluídas no novo teto de gastos e fechou ralos para a expansão das despesas além do previsto na Lei.
Creio que o texto merece ter todo apoio e aposto que será aprovado por ampla maioria. Lembrando que é apenas o primeiro passo dentre as mudanças necessárias – entre elas a reforma tributária – para que o Brasil possa consolidar um novo modelo de desenvolvimento sustentável, consistente, duradouro e dinâmico.
Marcus Pestana, economista, ex-deputado federal (PSDB-MG)