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Ameaça de golpe continua pairando sobre o Brasil e o Supremo se cala

A grande imprensa, em especial a Globo, ignorou solenemente a denúncia da revista “Piauí” segundo a qual o presidente Bolsonaro pensou, em maio último, dar um golpe usando tropas do Exército para fechar o Supremo Tribunal Federal. A revista revela que, possesso porque o ministro Celso de Mello, do STF, consultou a Procuradoria Geral da República sobre a apreensão do seu celular,  Bolsonaro reuniu os generais do Palácio do Planalto para tomar a decisão: “Vou intervir!”, teria dito. A publicação diz ainda que o fechamento da Corte Suprema só não aconteceu porque os generais Braga Neto, chefe da Casa Civil, e Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Interna, se manifestaram contra, afirmando que aquele “não era o momento”. Apenas o general Luiz Ramos, da Secretaria Geral da Presidência, foi a favor. O episódio deve servir de alerta, porque volta e meia alguém levanta a bandeira  do fechamento do Supremo, o que deixa evidente que a questão é pauta permanente das conversas nos subterrâneos do poder.

A atitude do capitão na verdade não causou nenhuma surpresa, pois antes mesmo de assumir o governo um dos seus filhos já dizia que para fechar o STF “bastava um cabo e um soldado”. O que surpreende, mesmo, é o estranho silêncio dos presidentes da Câmara dos Deputados, do Senado e do próprio Supremo, que não deram um gemido sequer em reação à ameaça de golpe. Estão com medo? Não fora vozes isoladas da oposição reagindo à atitude de Bolsonaro e ficaria a impressão de que todo mundo está mesmo com medo, inclusive a imprensa. Afinal, todos sabem que o capitão tem sonhos ditatoriais e não hesitará em fechar também o Congresso Nacional para fazer o que bem entende sem ser contestado. Diante disso, se não houver uma reação das instituições à altura da gravidade do episódio a possibilidade do golpe fica mais  visível a cada dia, até porque os comandantes das Forças Armadas não emitem nenhum sinal de que discordam do capitão, afastando a ameaça e tranquilizando a população. O silêncio deles deve ser motivo de preocupação.

Na verdade, não é de hoje que Bolsonaro  revela sua disposição de dar o golpe. Não faz muito tempo, indignado por conta de uma decisão do STF,  chegou a gritar aos seus apoiadores, na porta do Palácio da Alvorada, uma frase curta própria de um estadista: “Acabou, porra!”. Ainda não acabou, mas se as instituições democráticas permanecerem em silêncio, de braços cruzados, é óbvio que tende a acabar, pois o capitão vem se fortalecendo junto aos militares para agir no “momento certo”, conforme lembraram os generais palacianos. Além de militarizar o governo, nomeando mais de dois mil militares da ativa e da reserva para cargos nos diversos escalões,  Bolsonaro prometeu aumento de salário para a tropa e, inteligentemente, participa de todos os eventos militares, estreitando os laços com os seus antigos colegas de farda. Recente pesquisa revela que ele tem o apoio de 41% dos policiais militares de baixa patente. E o que é mais grave, ainda segundo a mesma pesquisa divulgada pelo portal UOL: 12% dos PMs, 7% dos policiais civis e 2% dos policiais federais apoiam o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, o que representa um contingente de mais de 95,8 mil agentes de segurança pública. 

O presidente do STF, ministro Dias Toffoli, que tem um general como assessor, ainda não disse uma palavra sobre a ameaça de Bolsonaro revelada pela revista “Piauí”, o que está sendo interpretado como covardia. Na realidade, por conta de suas omissões diante de injustiças e situações graves, a Corte Suprema perdeu a austeridade e o respeito, sendo enxovalhada por todo mundo, inclusive por bolsonaristas que saem às ruas fantasiados de amarelo para pedir o seu fechamento e intervenção militar. As suas ordens não são acatadas nem pelo ministro da Justiça, que se recusou a entregar os documentos relacionados com os dossiês de mais de 500 servidores investigados pelo novo SNI montado na pasta. Usando a experiência da ditadura, o capitão está aparelhando o governo com um serviço extra-oficial de inteligência para impedir qualquer movimento da oposição. O dossiê de servidores antifascistas é apenas parte da estrutura que está montando para ter o controle absoluto de tudo. E ninguém se espante se também tiver dossiês de ministros do Supremo. 

O fato é que se ninguém fizer nada para conter a disposição ditatorial de Bolsonaro mais cedo ou mais tarde ele dará mesmo o golpe, até porque ele já emitiu sinais de que não aceitará uma possível derrota nas eleições presidenciais de 2022, mesma atitude adotada pelo seu ídolo Donald Trump.  Levando-se em conta que o dono do Congresso, Rodrigo Maia, engaveta todos os pedidos de impeachment, parece que a única solução para impedir uma ruptura será a cassação, pelo Tribunal Superior Eleitoral, da chapa Bolsonaro-Mourão. Afinal, motivos não faltam. O  que falta mesmo, ao que parece, é coragem.


Ribamar Fonseca, Jornalista e escritor

Fonte: https://www.brasil247.com