O Brasil participa atualmente de duas negociações econômicas de importância estratégica – importância muito mais negativa do que positiva, como vou explicar. Refiro-me ao acordo Mercosul/União Europeia e à entrada do Brasil na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
As duas remontam ao governo Temer, que decidiu pleitear o ingresso na OCDE e retomar negociações antigas com a União Europeia. Foram levadas adiante pelo governo Bolsonaro, mas estão basicamente paralisadas, por obra das suas políticas climáticas. Dificilmenteserão concluídas enquanto o governo não for substituído ou não mudar suaspolíticas nessa área (e a primeira hipótese parece mais fácil do que segunda!).
As duas questões devem ficar para um outro governo, que começará em janeiro de 2023, admitindo-se que Bolsonaro chegue ao final do seu mandato, mas não alcance a reeleição. (Deixo de lado, neste artigo, a possibilidade – a melhor para o País – de que o seu mandato acabe sendo abreviado, terminando antes das eleições de 2022.).
Do governo Bolsonaro, um dos poucos bons resultados – completamente involuntário – é o de ter inviabilizado, com suas políticas de destruição ambiental, tanto a entrada na OCDE quanto a ratificação do acordo com a União Europeia. Como diz meu amigo Gabriel Ciríaco, “há Salles que vêm para bem”. Diga-se de passagem, que uma administração Mourão, que adotaria presumivelmente política ambiental mais civilizada, traria a desvantagem de talvez viabilizar a conclusão dessas duas iniciativas, emparedando o próximo governo.
Porém, o mais provável é que Lula ou Ciro Gomes, ambos defensores de políticas de desenvolvimento, venham a ser confrontados, se eleitos, com as duas em aberto: a) um acordo pronto ou praticamente pronto, mas ainda não ratificado, entre o Mercosul e a União Europeia; e b) um processo relativamente adiantado de preparação para a entrada do País na OCDE. Como nem Ciro nem Lula dariam continuidade aos descalabros ambientais do atual governo, o caminho estaria aberto para finalizar as negociações internacionais em curso. Pequeno problema: elas se chocam frontalmente com a autonomia das políticas nacionais de desenvolvimento.
Se, por outro lado, o vencedor das eleições for alguém da direita tradicional, não-bolsonarista, digamos Mandetta, Dória ou Jereissati, é provável que a questão se coloque de outra forma e sem grandes dificuldades, pois a finalização das duas negociações se enquadra perfeitamente na agenda neoliberal tradicionalmente defendidas pelas forças políticas que eles representam.
Quais são os argumentos neoliberais? São, em boa medida, genéricosou de natureza ideológica, do tipo “O Brasil precisa estreitar laços com os países mais avançados”, “não podemos ficar restritos ao mundo emergente e em desenvolvimento”, “precisamos modernizar e abrir a economia”, “temos de aprimorar nossas leis e regulamentos e obter um selo de qualidade”. Conversa que não comove nenhum país emergente que tenha noção dos seus objetivos de longo prazo e da importância de conservar margem de manobra na definição de políticas públicas.
Paulo Nogueira Batista Jr, economista, foi vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento do BRICS e diretor executivo no FMI pelo Brasil.
Fonte: https://www.brasil247.com