O Ministério da Fazenda elevou a projeção de crescimento do ano de 2,5% para 3,2% e isso não foi considerado nenhum absurdo pelos economistas que eu ouvi. Nem todos apostam em alta do PIB acima de 3%, mas há sim essa possibilidade. Se o PIB crescer zero no terceiro trimestre, fechará em 3% em 2023 como efeito do carregamento estatístico. Os indicadores econômicos têm ficado melhores a cada rodada de revisões ou a cada nova estatística divulgada. Não é uma alta forte, mas se olharmos em volta, Chile, Argentina e Colômbia terminarão o ano com recessão.
Nas projeções para a economia, o governo tem estado na ponta mais otimista, mas não distante do restante do mercado financeiro. O ano foi ficando melhor de fato, com surpresas positivas no primeiro e no segundo trimestre, tanto na inflação quanto no crescimento. No terceiro trimestre, contudo, os indicadores deverão refletir a desaceleração, provocada pelo fato de que não haverá mais o impacto da alta da agricultura, e está sendo mais sentido o efeito do aperto do crédito tanto no consumo, quanto nos investimentos. A Selic vai cair novamente amanhã, e com indicações de continuidade do ciclo, só que os juros ficaram altos por muito tempo enquanto a inflação caía, o que elevou a taxa real.
Mesmo que cresça zero nesse terceiro trimestre, o resultado já acumulado de tudo o que aconteceu na economia — , alta de 1,9% no primeiro trimestre e 0,9% no segundo trimestre — permitirá um crescimento em torno de 3%. Um número muito bom levando-se em conta que no começo do ano a projeção era menos que 1%. Mas há bancos que acham que o número do PIB será negativo neste terceiro trimestre e isso levará o crescimento do ano para um número um pouco abaixo de 3%. Por exemplo, o BV projeta 2,8%. O Bradesco, 2,7% . Há quem esteja com 3% com viés de alta, como é o caso da MBA, até porque os dados setoriais do terceiro trimestre estão vindo, de novo, melhores do que o esperado.
Se por um lado há o efeito inegável dos juros altos, há também o reflexo do programa Desenrola que está aliviando muita gente. Outro fato positivo da economia é a inflação de alimentos sempre em queda durante o ano. Há uma deflação em 12 meses, principalmente no item mais importante, a alimentação no domicílio.
As notícias não são exuberantes, mas estão espalhadas pela economia, mesmo nesse momento em que se chega na parte mais fraca do ano. É por isso que semanalmente o Boletim Focus tem mostrado inflação em queda, PIB em alta, como aconteceu ontem quando foram revistos para 2,89% de crescimento, e 4,86% de inflação.
GLOBO publicou ontem matéria de Vitor da Costa e João Sorima Neto mostrando que o saldo comercial já está em US$ 62 bilhões até agosto e deve fechar o ano com o número recorde de US$ 90 bilhões. O interessante é que isso ocorre apesar de o país estar crescendo mais, os preços de várias commodities terem caído, e o real ter se valorizado durante o ano. Altas de saldo comercial só aconteciam no passado quando havia desvalorização, boom de commodities ou recessão. Desta vez, uma das explicações para o crescimento do superávit é a super safra. A outra é a capacidade de o Brasil ocupar novos espaços no mercado internacional, abertos com a desorganização das cadeias produtivas provocadas pela guerra da Rússia contra a Ucrânia.
O que ameaça esse clima de recuperação da economia e de bons indicadores é a dúvida fiscal. O equilíbrio orçamentário de 2024 depende muito das medidas a serem votadas no Congresso, além disso será preciso evitar as pautas que representem aumento de despesas públicas, como a incorporação de servidores dos antigos territórios dentro do funcionalismo público federal, ou a ampliação da compensação dada aos estados e municípios pelas desoneração imposta pelo governo anterior.
O mercado olha cada um desses sinais do Congresso com temores de que o crescimento das despesas se torne uma certeza, principalmente as obrigatórias, e a recuperação da receita vire uma incerteza. No Ministério da Fazenda, o que se diz é que o aumento da receita não é miragem e que cada um dos projetos que está tramitando pode trazer recursos além do que foi projetado. Seja como for, uma lufada de ar frio pode acabar prejudicando a economia que aos poucos vem retomando o caminho do crescimento.
Míriam Leitão, jornalista
Fonte: https://oglobo.globo.com/