A humanidade já resolveu muitas charadas. A primeira foi sobreviver, e a prova é que hoje somos perto de 8 bilhões. Nas últimas décadas tal sucesso passou a ameaçar nossa sobrevivência com a crescente degradação da nossa única fazenda, a Terra. Como o fazendeiro que ultrapassa a capacidade da sua gleba, já superamos vários limites planetários: perda de biodiversidade, desertificação, áreas mortas nos mares, declínio dos cardumes, secas e enchentes extremas, o acúmulo de lixo na terra, no mar e no ar.
Metade dos oito bilhões, diz o Banco Mundial, tenta sobreviver com menos de cinco dólares por dia, não tem esgoto coletado e dois bilhões não têm água potável em casa. É urgente melhorar tal situação. Para tanto, será inevitável gerar mais lixo, mais poluentes, mais riscos à própria sobrevivência da espécie?
Certamente há outro caminho. Há que resolver o enigma e mudar o rumo, sob pena de piorar as chances para todos os oito bilhões.
No Brasil, em 2020, cinquenta milhões de pessoas tentavam sobreviver com renda abaixo daquele valor, trinta milhões não recebiam água em casa e quase cem milhões não tinham esgoto coletado. É o mesmo desafio global: como melhorar as condições de vida dessas pessoas sem gerar mais lixo, em todas as suas formas, e agravar as chances de sobreviver?
Faltam detalhes do caminho, mas a direção está clara. É certo, porém, que buscar simplesmente o “crescimento da economia”, tentando retomar o caminho que tem levado à destruição da habitabilidade do planeta, não é promissor. Pelo contrário, agravará os riscos atuais.
Algumas das diretrizes para construir um novo caminho já são conhecidas: descarbonizar a economia, prolongar a vida útil dos produtos, reduzir o consumo supérfluo, produzir e consumir localmente, reduzir o desperdício; reduzir, reciclar e reutilizar; assegurar renda mínima àqueles que nem emprego conseguem; entre outras. À exceção do último, todos eles conflitam com o propósito de “crescer a economia”, objetivo este que vai de encontro a um futuro saudável: como a Terra é um mínimo ponto azul no universo, manter o mesmo rumo é fisicamente impossível.
E o Brasil nesse quadro? Temos que caminhar rápido no sentido reconstruir a habitabilidade do nosso território e do planeta, apoiando todas as iniciativas nesse sentido. Entre crescer sempre e chegarmos ao desastre, ou mudar para que a metade mais pobre tenha dignidade, só a segunda opção, que exige inovações promissoras, é viável.
Temos que alterar nossa estrutura tributária para apenar todos os serviços e produtos que geram degradação do território, da água e do ar, e incentivar todos aqueles que os restauram. Claro, mais fácil dizer que implantar.
Noutras palavras, o rumo está claro, embora não a estrada. Há que construí-la. Algum dos ditos presidenciáveis tem algo a sugerir?
Eduardo Fernandez Silva, ex-Diretor da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados
Fonte: https://www.metropoles.com