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Geral

Dando a volta por cima

Desempregado, Jânio apostou na farinha do Juruá e já gera empregos para outros como ele

Cantada em prosa e verso pelo violeiro Xangai, o qual, num forró animado afirma que: “Se farinha fosse americana, macaxeira importada, banquete de bacana era farinhada!”

Presente na mesa de praticamente todos os brasileiros e, especialmente na dos acreanos, há farinha para todos os gostos e sabores, e as do Juruá se destacam nessas qualidades. Ao perder o emprego de motorista na Emurb, no final de 2016, Jânio Lopes de Lima pegou os R$ 3 mil da indenização para buscar farinha e outros produtos regionais do Juruá a fim de vender e assim garantir a sobrevivência de sua família na Capital.

”Eu estava desempregado e só se falava em crise, então os empregos sumiram, mas queria visitar a família em Cruzeiro e decidi que ia usar o único dinheiro que tinha para trazer farinha, gramixó, alfenim e biscoitos para vender e sobreviver. Logo percebi que as pessoas gostavam demais dos nossos produtos e assim eu tinha um bom negócio nas mãos!” Explica Jânio.

Começar do começo

Tudo o que Jânio tinha era o dinheiro de sua indenização e uma casa alugada na rua de entrada para o conjunto Esperança pela Estrada da Floresta. À porta de entrada da garagem instalou uma banquinha sobre a qual arrumava os vários tipos de farinha, feijões, mel de cana, açúcar mascavo, alfenim, pó e xarope de guaraná, além, é claro, dos famosos biscoitos de goma do Juruá.

Jânio e a esposa Thainara de Fátima Alves Cavaliéri se alternavam nas vendas que foram aumentando a cada dia que o ponto se tornava mais conhecido e mais produtos como a farinha milito de Tarauacá e o açaí de Feijó, queijo e manteiga de Capixaba e outros itens regionais foram aumentando a fartura de ofertas.

Negócio de família

Mais que um negócio nascido da necessidade, Jânio soube somar a família como agregador do negócio, assim as farinhas são produzidas por primos que ainda vivem na zona rural de Cruzeiro, os produtos da cana feitos por um tio de lá, já o açaí de Feijó é garantido por um primo da esposa que é de lá mesmo.

geral 2Nas prateleiras, a diversidade dos produtos típicos do Juruá - Fotos: Juracy Xangai

A casa da farinha

Pouco mais de dois anos após iniciar o negócio na cara e na coragem, a Banca do Jânio cresceu e se transformou numa verdadeira casa de farinha onde além da lojinha para a venda dos produtos regionais, montou sala com mesas para que seus clientes possam apreciar ali mesmo seus produtos feitos na hora.

Café com ou sem açúcar, leite e sucos regionais regam os bolos de macaxeira, biscoitos de goma, sequilhos, pés de moleque, beijus de massa de mandioca ou de goma, mingaus em uma lista de sabores que só aumentam.

Quando o locatário pediu a devolução da casa que alugava ali na rua General Vieira de Melo, entrada do Esperança, eu já tinha comprado este terreno na rua Avestruz que fica duas ruas mais para dentro do Esperança seguindo a mesma calçada onde ficava a banca. Teve de começar tudo de novo, vendi o carro e alguns objetos juntando dinheiro para a construção, em menos de dois meses, no terreno vazio, estava pronta sua casa própria.

“Construí a loja e uma sala ampla para as pessoas poderem esperar e conversar enquanto chegasse os produtos que são feitos na hora na casa de farinha, mas logo elas começaram a pedir um café e comer ali mesmo as tapiocas e tapiocões regadas a leite de castanha ou leite de coco, os beijus quentinhos, os bolos e biscoitos saindo do forno, só depois compravam os de levar para casa. Percebendo isso eu instalei logo as mesas, uma televisão e espelhos para terem mais conforto. Hoje o café da manhã lota de pessoas que vêm de quinta a domingo apreciar nossos produtos”, afirma Jânio.

Escola da infância

Criado numa colônia às margens do rio Moa, em Cruzeiro do Sul, Jânio já pegava nas pás de torrar farinha desde criança, seus cuidados para fazer a boa farinha renderam fama na família e até os vizinhos o contratavam para cuidar das suas farinhadas.

“Com menos de dez anos eu já passava o dia inteiro torrando farinha em casa, pros parentes e vizinhos, o pessoal me pagava e eu gostava mesmo de trabalhar, fazia com gosto, assim a farinha e os beijus ficavam muito melhores, mas confesso que depois que me mudei para a cidade nunca pensei em viver da farinha, mas esse negócio é meu destino mesmo”, conclui.

Mais que um simples café da manhã, a casa de farinha acabou se transformando num ponto turístico onde pais levam seus filhos para ver como a são feitas suas delícias e como têm mais sabor ao serem apreciados na hora. Outros adultos vão para recordar os tempos idos reavivando assim a memória dos cheiros e sabores.

Marina das farinhas e biscoitos

Se Jânio aprendeu faz boa farinha, biscoito e outros produtos do Juruá que encantam quem os aprecia em todo o Brasil, ele teve como mestra sua mãe Marina Lopes de Lima mãe de cinco filhos e que do alto dos seus 65 anos afirma: “A mandioca sempre foi nossa vida, desde menina aprendi fazer de tudo para comer e vender!”

Assim que decidiu construir a casa de farinha Jânio trouxe a mãe, dona Marina para ensinar sua equipe a preparar as verdadeiras delícias do Juruá.

“Nasci no seringal São Salvados margens do rio moa, meu pai era seringalista, mas com o fim da borracha viramos agricultores, por isso desde pequena aprendi a trabalhar com a macaxeira. Com sete anos viemos morar no Humaitá do Moa, já perto de Cruzeiro e nossa principal lavoura sempre foi a mandioca”, recorda Marina.

Ralar a mandioca para tirar dela a goma e aproveitar a massa para os beijus, além de fazer as farinha branca e amarela, biscoitos e sequilho eram os produtos mais vendidos. Já para o consumo da casa faziam também a farinha de carimã que substitui o trigo em quase tudo, ainda a massa fina com o que se faziam mingaus para crianças.

O tucupi sempre apreciado no preparo de molhos de pimenta ou acompanhando carnes temperado com muito jambu sempre presentes no cardápio, mas Marina tinha ainda suas preferências: “Um porco ou carne de caça assada com macaxeira cozida é a coisa mais gostosa do mundo”, garante.

Sempre aprendendo

Marina herdou de Marlícia da Costa Maciel as receitas que faziam juntas enquanto trabalhava por diárias na casa dela preparando as delícias.

“Todo mundo aprecia estes nossos biscoitos de goma que levam leite, ovos, açúcar e coco no preparo. Eu gosto muito de fazer isso e vim ensinar os meninos do Jânio aqui em Rio Branco, na verdade eu nunca tinha pensado em vir fazer biscoito e beiju na Capital”, conclui Marina com um sorriso.

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