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O desperdício nosso de cada dia 

Um dos principais desafios da sociedade moderna é produzir e fazer chegar alimentos em quantidade e qualidade para toda a população mundial. Somos hoje quase oito bilhões de pessoas vivendo em um planeta com grandes desigualdades.

Muitas vezes, os alimentos transitam por longas distâncias e são consumidos em países que não os produziram, fazendo, assim, muita falta nas mesas dos seus países de origem, alimentando bocas muito distantes das mãos que os produziram.

Enquanto um país como a Áustria, com uma área de 83.853 km2, detém o maior consumo per capita de calorias no mundo, no Brasil, com uma área cem vezes maior, e segundo maior exportador agrícola mundial, 19 milhões de pessoas enfrentaram a fome no ano de 2020, de acordo com a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional.

Conforme relatório “O Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo 2020″, elaborado pela FAO, mais de 820 milhões de pessoas no mundo passam fome nos dias atuais, e essa população de famintos tem aumentado nos três últimos anos seguidos.

Na América Latina e Caribe, mais de 47 milhões de pessoas não tinham o que comer em 2020, ocorrendo ainda um grande risco de agravamento destes números, já que não consideram o impacto da crise econômica agravada pela pandemia de Covid 19.

Por outro lado, o relatório sobre “Desperdício e Perda de Alimentos” do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, publicado no último mês de março, informa que mais de 1,3 bilhão de toneladas de alimentos, ou 33% de tudo que foi produzido no mundo, foram parar no lixo em 2019.

No Brasil, 26,3 milhões de toneladas de comida foram desperdiçadas em 2020. Conviver com a contradição entre a fome e o desperdício é algo muito desconfortável e que deve nos mobilizar para reverter este cenário. Não se pode ficar insensível a isso.

Em nosso país, a cultura do desperdício é marcante e constrangedora. Desperdiçamos 37% de toda a água tratada pelos sistemas de abastecimento público devido à vazamento, ligações irregulares, falta de medição ou medição incorreta e roubos.

O desperdício de energia nos últimos três anos equivale a 1,4 vezes toda a produção da usina de Itaipu em 2016. Desperdiçamos tempo, conhecimentos e batalhas. Desperdiçamos tanto que nem percebemos o que está indo embora. O desperdício de hoje certamente será a necessidade de amanhã.

No dia 29 de setembro deste ano, a ONU celebrará pela primeira vez o Dia Internacional da Perda e Conscientização sobre o Desperdício de Alimentos. Devemos agir para que isso não seja apenas mais uma data em nosso calendário.

Devemos perceber que, além da fome, que, por si só, é uma das principais mazelas da sociedade, com o desperdício de alimentos ocorrem perdas de todo um sistema de produção como água, energia, mão-de-obra, além de gerarem mais lixões e emissões que causam o efeito estufa.

Precisamos, o quanto antes, olhar à nossa volta e enxergar as desigualdades em que vivemos. Precisamos rever hoje nossos hábitos de consumo e reduzir os nossos desperdícios. Precisamos ter políticas públicas para amenizar tão grave questão e, para isso, não podemos nos dar ao luxo de também desperdiçar nosso principal instrumento de nossa cidadania, o voto. Esse é um desafio árduo para nossa sociedade, mas, precisamos acreditar que seja possível.


Emiliano Lobo de Godoi é Diretor Geral de Extensão e coordenador do Programa Sustentável da Universidade Federal de Goiás;

Fonte: https://capitalpolitico.com

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