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Força de prefeitos relativiza polarização nas eleições

Força de prefeitos relativiza polarização nas eleições

A força dos prefeitos candidatos à reeleição este ano deve prevalecer sobre a polarização nacional entre os apoiadores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-presidente Jair Bolsonaro. Dos 26 prefeitos de capital, 17 devem disputar um novo mandato e apenas dois - Rogério Cruz (Republicanos) em Goiânia e Fuad Noman (PSD) em Belo Horizonte - não despontam em pesquisas de forma competitiva, ao menos em empate estatístico com o segundo colocado.

Onze lideram, como é o caso de João Campos (PSB), no Recife, e cinco estão no páreo para um segundo turno, como Ricardo Nunes (MDB) em São Paulo ou José Sarto (PDT) em Fortaleza. Não há pesquisas recentes disponíveis em Boa Vista, onde o prefeito Artur Henrique (MDB) é bem avaliado.

“O primeiro fator será a avaliação do incumbente. A polarização nacional virá depois”, admitiu o pesquisador Felipe Nunes, da Quaest, um teórico da polarização exacerbada no país entre esquerda e direita.

“A polarização vai ajudar a projetar nomes, mas o perfil de administrador será determinante”, aposta Antonio Lavareda, do Ipespe, que faz no entanto uma ressalva: o índice de reeleição na eleição municipal tende a ser menor do que em 2020. “No nosso agregador de pesquisas 58% dos prefeitos de capital estão na liderança. O índice de reeleição há quatro anos foi 77%”, afirmou.

Lavareda cita como exemplo da prevalência da força da reeleição sobre a polarização o caso do Recife. Em 2022, Lula ganhou no primeiro turno com 54% dos votos, ante 39% de Bolsonaro e 7% dos outros candidatos.

Na pesquisa de dezembro do Ipespe realizada na capital pernambucana, a vantagem de intenção de voto do prefeito João Campos sobre o segundo colocado era de 49 pontos percentuais. “Campos evidentemente deve ter o apoio de Lula, mas o resultado não reflete a polarização que existe no Recife quando se trata da avaliação do presidente da República”, disse.

A eleição de 2020 foi marcada pela pandemia de covid-19. Prefeitos que souberam fazer uma boa gestão da emergência sanitária ganharam pontos e o governo federal aumentou as transferências para os municípios, que estavam com o caixa menos vazio. Não há dados consolidados sobre o caixa das prefeituras em 2023, mas há indícios de que ainda existe margem para ações fiscais de olho no quadro eleitoral.

No mês passado, a Prefeitura de São Paulo anunciou o “domingão tarifa zero”, garantindo gratuidade no transporte coletivo de ônibus aos domingos.

Mesmo entre os prefeitos novos eleitos em 2020, o perfil administrativo pesou mais do que o ideológico, como foi o caso de Eduardo Paes (PSD) no Rio de Janeiro ou Bruno Reis (União Brasil) em Salvador. O PT não elegeu um único prefeito de capital. Bolsonaro estava sem partido em 2020, mas os candidatos que patrocinou tiveram resultados ruins na maioria dos grandes centros.

Na eleição de 2022, os prefeitos de capitais em sua maioria buscaram demarcar distância da eleição nacional. Alguns aderiram a um dos polos apenas no segundo turno, como Sebastião Melo (MDB) em Porto Alegre e Davi Almeida (Avante) em Manaus, que optaram por Bolsonaro, ou Sarto, em Fortaleza, que escolheu Lula. Outros, como Eduardo Braide (PSD), de São Luís, mantiveram-se neutros até o fim.

“Os partidos que mais elegem prefeito nunca elegeram o presidente e as eleições municipais são as que menos tendem a repetir a polarização nacional”, comenta Mauricio Moura, do instituto de pesquisas Ideia. Sem prefeitos de capital, O PT não tende a lançar candidato próprio em centros como São Paulo, Rio de Janeiro, Belém, Salvador e Recife. O PL de Bolsonaro conta com um prefeito incumbente nas capitais, João Caldas, de Maceió.

Nas grandes cidades em que a reeleição não é possível, a polarização tende a ir para o primeiro plano. Um exemplo é Curitiba. O atual prefeito, Rafael Greca (PSD) nunca se alinhou à direita radical. Bem avaliado, já se reelegeu em 2020. Na sua ausência, lideram as pesquisas os candidatos mais próximos ao ex-presidente Jair Bolsonaro, independente das listas de nomes oferecidas aos pesquisados.

Buscar a polarização nacional também poderá ser um recurso para o incumbente que seja pouco conhecido ou que tenha uma administração municipal com menor aprovação popular. Esse tende a ser o caso em São Paulo, por exemplo. O prefeito Ricardo Nunes (MDB) negocia o apoio de Bolsonaro. Caso não obtenha esse apoio, a sua própria presença em um segundo turno contra o deputado Guilherme Boulos (Psol) está ameaçada.

Ao contrário de Boulos, que já concorreu a presidente em 2018 e a prefeito em 2020, Nunes disputa uma eleição majoritária pela primeira vez. Foi eleito há quatro anos como vice de Bruno Covas (PSDB). Embora tenha assumido o cargo em maio de 2021, com a morte do titular, seu índice de aprovação não passava de 23% de ótimo ou bom, de acordo com levantamento do Datafolha de setembro do ano passado. “A polarização permite a ele alcançar um eleitorado potencial acima de 40% na cidade”, comentou Felipe Nunes.

A disputa municipal em São Paulo neste ano é avaliada por Lavareda, Nunes e Moura como excepcionalmente incerta. “Tradicionalmente a eleição paulistana contrapõe um candidato mais votado no centro expandido a outro preferido pelas periferias. As primeiras pesquisas realizadas indicam que essa divisão não está clara no perfil do eleitorado dos três mais citados: Boulos, Nunes e a deputada Tabata Amaral (PSB)”, comenta Moura.

A virtual oficialização da ex-prefeita Marta Suplicy como vice de Boulos, em um retorno ao PT, tem como objetivo engajar na candidatura do Psol um contingente do eleitorado nas periferias ainda nostálgico da sua administração, encerrada em 2004. Dificilmente quebrará as resistências a Boulos entre as faixas do eleitorado mais sensíveis ao antipetismo. O prefeito paulistano deve ceder a vice para um nome do PL alinhado com Bolsonaro.

O risco para o emedebista é se contaminar com a alta rejeição do ex-presidente em São Paulo, cidade em que foi derrotado no primeiro e no segundo turno das eleições de 2022, em uma das maiores guinadas eleitorais no país em relação ao pleito presidencial de 2018.

César Felício, jornalista

Fonte: https://valor.globo.com/

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