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Baderna à beira-mar

Baderna à beira-mar

No momento em que o presidente Jair Bolsonaro se organiza para uma exibição de baderna no Rio no 7 de setembro, o palanque eleitoral do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Estado entra em rota de colisão. E nada disso é coincidência.

Em setembro de 2020 apareceram novos trechos da delação do ex-secretário Edmar Santos que levantavam suspeitas sobre a participação do então governador em exercício, Cláudio Castro, do PL, e do presidente da Assembleia Legislativa do Rio, André Ceciliano, do PT, num suposto esquema de propinas na Secretaria de Saúde do Rio.

Ambos negaram a acusação e, como o procurador-geral da República, Augusto Aras, atendeu ao pedido do presidente da República para não colocá-los no mesmo balaio de Wilson Witzel, removido do Palácio da Guanabara, ficou tudo por isso mesmo.

Daí conclui-se que Bolsonaro tem Castro e, consequentemente, sua polícia militar, na mão, circunstância inexistente no 7 de setembro do ano passado, quando a PM de São Paulo foi mantida sob rédea curta.

Se não se promove um golpe de Estado com um desfile militar na Avenida Atlântica, é, sim, possível, quando se tem controle da polícia, orquestrar atentados, ocultar mandantes e provocar um fato político a menos de um mês do primeiro turno. Foi isso que aconteceu em 2018 quando mataram Marielle Franco num Rio sob intervenção militar.

A baderna pode acontecer quando já terá entrado em vigor o auxílio emergencial de R$ 600, que a campanha de Lula já reconhece, pode reduzir sua vantagem sobre Bolsonaro, para o patamar dos dez pontos. Só uma oposição unida, principalmente, no Rio, pode ser capaz de reagir a fatos como este. E é esta unidade que está ameaçada pelo embate entre PT e PSB no Rio, terceiro maior colégio eleitoral do país.

O palanque do deputado federal Marcelo Freixo (PSB) se apresenta com estas credenciais, por unir o ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários, Marcelo Trindade (Novo), à líder da favela do Borel, zona Norte do Rio, Inês Ferreira, passando pela companhia, na chapa, do ex-prefeito e hoje vereador, Cesar Maia (PSDB).

Só o eleitor será capaz de confirmar a competitividade eleitoral indicada nas pesquisas, mas o apoio a Freixo representa uma resistência à ordem bolsonarista no Estado que deu expressão eleitoral ao presidente e à sua família. É isto que o PT ameaça sacrificar. Como nem o deputado federal Alessandro Molon (PSB) nem Ceciliano se põem de acordo sobre qual deles vai perder para Romário, candidato à reeleição ao Senado pelo PL, PT e PSB arriscam pôr abaixo a competitividade de seu palanque estadual.

Molon sabia, desde a entrada de Freixo no PSB, que o PT exigiria um dos cargos majoritários em disputa. Só não contava que seu novo correligionário levasse à frente, de fato, a disposição de disputar o governo. Lula nunca engoliu o que enxerga como lavajatismo de Molon. Por isso, se for derrotado na disputa pelo Senado, o deputado do PSB não teria chance de assumir ministério num eventual governo do PT.

Molon, porém, pode ficar sem mandato e manter sua liberdade. Eleito duas vezes, como candidato único, à Presidência da Assembleia Legislativa do Rio, notório entreposto do crime, Ceciliano já não desfruta da mesma prerrogativa. Por isso, aposta o PSB, acabará por recuar do Senado. Se Lula não está disposto a queimar caravelas por Molon, tampouco o fará por Ceciliano, que não lhe agrega eleitor. O presidente da Alerj chove no molhado do eleitorado bolsonarista da Baixada Fluminense e não vira voto.

Ao preterir a candidatura do ex-deputado constituinte Vladimir Palmeira, em 1998, o PT foi escada para que a dinastia Garotinho proliferasse no Rio de Janeiro. Naquele ano, Lula ganhou por dois mil votos no Estado, mas lhe faltaram 14 milhões para impedir a reeleição do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

O PT fluminense tanto fez que perdeu aqueles com os quais hoje busca se aliar e deixou que a legenda fosse comandada pelo atraso. Como não pode intervir nas candidaturas de outras legendas, resta a Lula enfrentar a ala bolsonarista de seu partido e manter palanque duplo para o Senado, como acontece em muitos outros Estados.

A era Bolsonaro interrompeu uma sucessão de cinco vitórias de candidaturas presidenciais petistas no Rio. Desta vez, Lula está à frente, mas por uma vantagem inferior àquela que pontua nacionalmente. Enfrenta, ainda, o peso do voto evangélico bolsonarista, que pode fazer diferença na reta final. E não apenas no Rio.

A sobrevivência eleitoral da família Bolsonaro depende, em grande parte, do resultado das urnas fluminenses. Não apenas pelo que pode representar para as bases eleitorais de seu grupo político uma troca de guarda nas instituições policiais e de controle do Estado, como também pelo simbolismo de manter o Rio como um reduto do antilulismo.

Esta é outra razão pela qual Bolsonaro escolheu o Rio para sua grande investida do sete de setembro. Só a preservação de um palanque amplo e democrático de resistência será capaz de garantir ao eleitor a prerrogativa de dono da festa.

Fardas e togas

O deslocamento das ameaças bolsonaristas de Brasília para o Rio sinaliza que as Forças Armadas cultivam melhores expectativas em relação ao próximo ministro do TSE, Alexandre de Moraes, do que o presidente gostaria. A aproximação dos militares com as instituições de controle não param por aí. Ontem o ministro da Defesa, general Paulo Sergio Oliveira, levou representantes das Três Forças para um almoço com todos os ministros do Tribunal de Contas da União na sede da Corte.

Redução do diesel à vista

Depois de duas reduções seguintes no preço da gasolina, chegou a vez do diesel. A queda no preço, que se deve a uma combinação de câmbio favorável e redução na cotação internacional do barril, é esperada ainda esta semana. Pelo peso no transporte de cargas, a queda no preço do diesel pode ajudar na deflação de alimentos mais do que a da gasolina. Se a redução deste combustível já se refletiu no avanço de Bolsonaro nas pesquisas, a do diesel se somará à entrada em vigor do auxílio de R$ 600 na próxima semana. O Planalto pressiona por uma estratégia de reduções sistemáticas no combustível até 2 de outubro. No PT, o sinal de alerta virou uma sirene.


Maria Cristina Fernandes, jornalista

Fonte: https://valor.globo.com/

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