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A psicologia do eleitor

É indecifrável a psicologia do eleitor. Mesmo aos mais argutos cientistas políticos ou sociólogos é difícil prever como reagirá o eleitorado diante da avalanche de informações e acusações falsas e verdadeiras, trocadas durante campanhas.

O problema se acentua diante da volubilidade dos partidos. A legenda nada significa e a inflação de candidatos arrebanha nomes inexpressivos, para concorrerem contra políticos profissionais empenhados em manter privilégios garantidos por cadeira da Câmara dos Deputados ou do Senado. Antes de 1964 as coisas não se passavam exatamente assim. Quem pertencia às hostes do Partido Social Democrático (PSD) ou do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) não migrava para a União Democrática Nacional (UDN) e vice-versa.

São muitas as definições de partido político. Escolho a do senador e diplomata Gilberto Amado (1887-1969), para quem “partido político é a associação de indivíduos para a conquista e a fruição do poder, só e só”. A lacônica, mas precisa frase, reflete o cenário nacional. Já tivemos partidos consagrados à realização de ideais. Hoje, entretanto, o que existe são legendas cujos titulares se dedicam à luta pelo poder e de tudo que pode proporcionar, “só e só”.

Lenin disse que “sem um programa o partido não pode existir”. Segundo Hans Kelsen “toda democracia é democracia de partidos”. As frases são boas, mas não se aplicam por aqui, onde programas são escritos e impressos para cumprirem exigências legais. Valem tanto quanto o desgastado texto constitucional e juramentos de riqueza fácil ou de recuperação da saúde, feitas por pastores, bispos e bispas de algumas congregações neopentecostais. Mudanças de legenda nada têm a ver com ideologia ou programa. Acontecem com os olhos postos nas próximas eleições.

Variar de partido é possível. Pertence à história a frase do Conselheiro Bernardo Pereira de Vasconcelos (1795-1850), um dos principais políticos do período conhecido como Regência (1831-1840). Ao passar do Partido Liberal para o Partido Conservador, assim se justificou: “Fui liberal; então a liberdade era nova no país; estava na aspiração de todos, mas não nas leis, não nas ideias práticas; o poder era tudo; fui liberal. Hoje, porém, é diverso o aspecto da Sociedade: os princípios democráticos tudo ganharam e muito comprometeram: a sociedade então corria o risco pelo poder; corre agora o risco pela desorganização e pela anarquia. Como então quis, quero hoje servi-la, quero salvá-la, por isso sou regressista”.

Durante a Regência ser liberal equivalia àquilo que hoje se define como progressista ou de esquerda. Conservador, ainda hoje é o político de direita. O Conselheiro Bernardo Pereira de Vasconcelos, combativo parlamentar do Partido Liberal, migrou para o Partido Conservador, ambos criados em 1831, “pelo risco de desorganização e pela anarquia”, que ameaçavam a integridade nacional.

Jair Bolsonaro é conservador ou liberal? De direita ou de esquerda? O conservador tende ao pragmatismo. O liberal se inclina em direção à utopia. Bolsonaro não governa como uma coisa ou outra. Representa aquilo que há de mais atrasado nas esferas políticas. Jamais esboçou projeto econômico ou social para o Brasil. É o negacionista que se recusa a admitir a gravidade da pandemia do coronavírus e insiste, apesar dos mortos e infectados, no combate insano à vacina, à máscara, ao distanciamento social.

Antípoda de Bolsonaro no planeta político, Lula se apresenta como de esquerda, Como aquele, entretanto, é pragmático, populista, demagogo, indiferente aos interesses públicos e consagrado a objetivos pessoais.  O programa do Bolsa Família não resgatou ninguém da pobreza, mas alavancou a reeleição e a candidatura Dilma Roussef. Será o seu cavalo de batalha na campanha eleitoral.

Padecemos de longo período de desorganização anárquica. As pesquisas indicam, entretanto, que Bolsonaro e Lula poderão chegar ao segundo turno. De muitos eleitores ouço dizer que “entre a cruz e a caldeirinha” optarão pela senadora Simone Tebet candidata do MDB, por ser mulher, combativa, idônea e não sofrer do mal da rejeição.

Para os candidatos da terceira via, é vital entender a psicologia do eleitorado. Quem cometer o erro de tentar atrair votos com projetos ambiciosos, mas para o povão carentes de credibilidade, estará “arando o mar”, ou “cavado buraco n’agua”.

Irá ao segundo turno quem for mais contundente e concentrar forças nos ataques à corrupção, ponto fraco dos dois principais adversários.


Almir Pazzianotto Pinto é Advogado. Foi Ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho

Fonte: https://osdivergentes.com.br

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